26.8.21

Sustentabilidade e greenwashing: entre o bem e o mal

 


«Galvanizados pelo impacto inolvidável das alterações climáticas que se sentem em qualquer recanto do globo, aumenta a nossa perceção sobre a necessidade de acelerar a passada, com vista, desde logo, à sua urgente mitigação.

Compromissos com os valores intrínsecos da sustentabilidade existem há alguns anos, porém, a morosidade na sua concretização impeliu um conjunto de iniciativas recentemente desenvolvidas, nomeadamente pela União Europeia e destinadas ao tecido empresarial e, em especial, às instituições financeiras. O enquadramento surge a partir do movimento ESG (Environment-Social-Governance), em português, Ambiente-Direitos Humanos-Governação, que evoca a necessidade dos investimentos serem canalizados para empresas mais sustentáveis e com preocupações, traduzidas nos seus objetivos e documentos de gestão, sociais e com os direitos humanos.

Foi este contexto que inspirou no seio da União Europeia dois Pactos (entre outros): o Ecológico Europeu (Green Deal), que sucedeu ao Protocolo de Quioto e ao Acordo de Paris e o de Ação para a Economia Circular, o qual tem vindo a ser concretizado através de atos legislativos dispersos, alguns já transpostos para o direito nacional.

Na agenda regulatória europeia, destacamos a Diretiva de Informação Não Financeira, que obriga as grandes empresas de interesse público a “prestar informação anual sobre questões ambientais, sociais e relativas aos trabalhadores, à igualdade entre mulheres e homens, à não discriminação, ao respeito dos direitos humanos, ao combate à corrupção e às tentativas de suborno”, em vigor em Portugal desde 2017. Em março deste ano, foi aprovada pelo Parlamento Europeu, uma Resolução sobre o dever de diligência e responsabilidade societária, dos administradores para com matéria relacionada com a sustentabilidade – direitos humanos, ambiente e governação, que prevê a instituição de um quadro de controlo e sancionatório. A que acrescem a Nova Diretiva de Governação Corporativa Sustentável, alinhada com a Agenda 2030 (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, em especial o Objetivo 12.6), ou a elaboração da nova Taxonomia Social que permitirá definir as bases dos ativos financeiros elegíveis do ponto de vista do investimento com finalidades sociais. A panóplia legislativa em curso tende, desde logo, a evitar um fenómeno recente conhecido como greenwashing. Este termo surgiu nos finais dos anos 80 do século passado e consiste na apresentação ao consumidor final de distorções informativas – informação exagerada, não objetiva e até fraudulenta – sobre as características “verdes” dos produtos comercializados pelas empresas, com o intuito de obter mais lucro. Comportamentos empresariais, eticamente reprováveis, desta ordem, também conhecidos por ecobranqueamento, podem inclusive constituir um retrocesso para a legislação já produzida no âmbito do direito do ambiente. O esforço atual da iniciativa política bem como da produção legislativa é real, pese embora muito caminho haja a percorrer.

Os resultados divulgados recentemente, de uma investigação realizada pela Consumer Protection Cooperation Network da Comissão Europeia, em colaboração com as autoridades nacionais de proteção dos consumidores, identificaram 344 casos de alegações de sustentabilidade. Deste universo, 59% não apresentavam qualquer tipo de provas e, em 37% dos casos, tratava-se de descrições vagas como sendo "amigos do ambiente".

Ao contrário do que sucedeu já em Itália ou no Reino Unido, países onde foram aplicadas sanções administrativas a empresas que divulgaram mensagens publicitárias suscetíveis de criar no consumidor médio a ideia de um benefício absoluto para o ambiente, por associação da ideia de redução de emissões de CO2 ao uso do produto publicitado, em Portugal não existe notícia da aplicação de qualquer sanção.

Somos nós, consumidores, que devemos, em primeira linha estar atentos a estes abusos, numa era que se quer “verde”, mas devidamente regulada.

Porque melhor definição de sustentabilidade não existe, do que esta, dada por uma criança da Costa do Marfim, país que vacila demasiado no respeito pelos direitos humanos, a um alto quadro de uma empresa internacional: “A sustentabilidade é como abraçar um imbondeiro. Não o conseguimos fazer sozinhos.”»

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