9.9.22

A diferença entre um pacote de medidas e medidas em pacote

 


«O primeiro aspecto que eu salientaria no pacote de medidas anti-inflação proposto pelo Governo é o facto de a palavra pacote ter um prestígio muito reduzido, seja por estar frequentemente associada a mousses de chocolate de qualidade inferior, seja por ser usada como gíria para rabo. Creio que se nota que não estudei economia. Mas quem estudou descobriu no pacote alguns aleijões que estão ao nível da reputação da palavra. Por exemplo, o Governo propõe baixar generosamente o IVA da energia dos 13% para os 6%. Acontece que a taxa de 13% incide sobre muito poucos consumos energéticos. A esmagadora maioria da energia é taxada a 23%, e assim continuará. Significa isto que prometer baixar o IVA da energia dos 13% para os 6% é como anunciar que os bifes de unicórnio passam a ser gratuitos no talho.

Outras críticas ao pacote de medidas, francamente, não me parecem ter razão de ser. Um caso flagrante é o das pensões. Os críticos acusam o Governo da seguinte habilidade: António Costa adianta aos reformados já em Outubro um aumento nas pensões que estava previsto apenas para o próximo ano. A contrapartida manhosa é que, assim, o Governo consegue fazer com que, na prática, nos próximos dois anos o valor das pensões acabe por diminuir face ao que estava previsto. Ou seja, apesar de receberem um aumento extraordinário no mês que vem, dentro de dois anos os reformados estarão a receber pensões menores do que teriam se não houvesse esta alteração. Para a oposição, isto é uma vigarice; para mim, é bem pensado pelo Governo. António Costa sabe que, no estado em que se encontra a saúde em Portugal, mais vale dar uma alegria já aos reformados do que confiar na hipótese remota de eles conseguirem durar mais dois anos. Os reformados que cometerem a proeza de ainda cá estar em 2024 terão demonstrado ser tão rijos que talvez não precisem de pensões mais elevadas. As ajudas do Estado destinam-se a quem precisa, e qualquer maior de 65 anos que seja capaz de resistir dois anos aqui revela não necessitar de auxílio. É como perguntar ao Rambo se precisa de ajuda para sobreviver duas horas na selva. Há super-heróis que não são tão poderosos. Havendo juízo nos estúdios da Marvel, o próximo filme seria sobre uma idosa que vive em Portugal com 509,6 euros por mês. Alzira, a Pensionista de Aço. Tenho o guião quase pronto. Contactem-me.»

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