1.12.22

A falta de excedente

 


«Temos um aeroporto em Lisboa onde aterram os turistas que vêm visitar-nos. Será que não chegam os turistas que já temos?

Pelos vistos, não, não chegam. Os turistas que chegam a Lisboa podem parecer muitos a quem teima andar pela Baixa, pelas zonas históricas e pelo centro da cidade. Mas, na verdade, são poucos.

Não chegam, por exemplo, para ocupar as zonas da cidade onde ainda persiste uma maioria de lisboetas que ainda não foram beneficiados pelo turismo. Também não chegam para cidades maravilhosas como Vila Franca de Xira, que são prejudicadas pela falta de excedente de turistas.

A falta de excedente é das piores aflições que uma cidade pode conhecer. Infelizmente, os turistas são monomaníacos e querem, a toda a força, ficar no centro de Lisboa, onde estão todos os outros turistas, servidos atenciosamente por alguns locais (ou locals) escolhidos que fazem de vizinhos e recomendam o melhor pastel de nata do bairro.

Felizmente, para nós portugueses, é fácil descobrir qual é: é aquele que se vende numa loja chamada O Melhor Pastel de Nata do Bairro. Não precisamos de ajuda. Mas eles sim.

Só havendo excedente de turistas e falta de camas é que eles serão forçados a gramar os encantos dos arrabaldes alfacinhas, tão castiços e autênticos, onde o abacate é servido em pão saloio e há sempre uma avozinha com bigode a ajudar na cozinha que “no spika da inglish”.

Um novo aeroporto é a única maneira de enfiar mais uns milhões de turistas nas malhas do nosso tão pouco anafado tecido urbano. A TAP já pediu que não houvesse limitações de horário, como há desgraçadamente na Portela, para fazer frente às exigências dos dorminhocos.

Mas há esperança. Um dia há-de vir em que se compreenderá que é muito violento pedir a um estrangeiro que se meta num avião para vir visitar o nosso país.

Finalmente, poderão construir-se passadeiras rolantes de alta velocidade que liguem as grandes cidades europeias a Lisboa e ao Porto. Gratuitas, obviamente.»

.

0 comments: