18.12.22

Imigração: é preciso virar a página

 


«Há um dado sobre 2021, no trabalho da Pordata, a propósito do Dia Internacional dos Migrantes, que brada injustiça. “Concedeu-se mais a nacionalidade portuguesa a pessoas a viver no estrangeiro do que a viver em Portugal.”

Aqueles que rumaram ao nosso país, para todos os dias, sob a mesma chuva e o mesmo sol que o resto da população, aqui conseguirem fazer a sua vida, têm menos direitos do que quem, muitas vezes sem ter posto o pé neste extremo ocidental da Europa, tem conseguido, com razoável simplicidade, obter a nacionalidade portuguesa.

A justificação de uma reparação histórica legítima, a da perseguição aos judeus por parte do Estado português, criou esta injustiça, ao permitir que a obtenção de nacionalidade se tornasse um negócio — que está sob inquérito judicial, após as investigações do PÚBLICO. Em 2011, cerca de duas mil pessoas a residir no estrangeiro obtiveram a nacionalidade portuguesa, enquanto no ano passado foram mais de 30 mil, para um total de 54.537 pessoas, que passaram a ser cidadãos nacionais.

Para uns, sem grande controlo, basta um atestado de ascendência sefardita, mais uns tantos documentos e algum dinheiro para contratar um escritório de advogados, enquanto outros têm de se arrastar em morosos processos no Instituto dos Registos e Notariado (IRN) que chegam a ultrapassar em dez vezes os prazos estabelecidos pela lei.

O Estado que falhou miseravelmente na lei dos sefarditas é o mesmo Estado que continua a falhar na forma como trata os que, dentro de portas, querem obter a nacionalidade portuguesa, como falha com quem quer obter uma autorização de residência. Os milhares de chamadas telefónicas que é preciso fazer para encontrar uma vaga no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) para regularizar a sua situação, as burlas no negócio de senhas para as intermináveis filas de espera, os 200 mil pedidos de residência em Portugal para avaliar são exemplos da violência a que estão sujeitos estes cidadãos.

Num país com graves problemas demográficos, que em 30 anos pode ver a sua população passar para sete ou oito milhões de pessoas, com todas as questões que daí advirão, é de uma estupidez criminosa tratar assim os querem ficar para sempre ligados ao nosso destino comum. Precisamos de melhores serviços no IRN, precisamos de virar a página do SEF, esperando que a nova Agência Portuguesa para as Migrações e Asilo não seja só uma mudança de nome. Estamos a desperdiçar riqueza, a comprometer o futuro e, antes de tudo, a tratar mal e injustamente quem devíamos receber de braços abertos.»

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