21.1.23

Questionário: uma manhosa “ferramenta política”

 

«Várias das perguntas colocadas concernem informação respeitante a terceiros, integrantes do “agregado familiar” da pessoa sob escrutínio. Independentemente da insegurança propiciada pelo facto de não se fornecer um conceito de “agregado familiar”, e de o universo familiar relevante para efeitos da Lei n.º 52/2019, que ignora tal terminologia, não coincidir com o conceito constante do Decreto-Lei n.º 70/2010, é imperativo questionarmo-nos sobre a legitimidade que assiste ao primeiro-ministro, num escrutínio desta natureza, para a realização de perguntas sobre a vida pessoal e profissional de terceiros, como as que se seguem: “algum membro do seu agregado familiar exerce atividades públicas no setor diretamente tutelado pela área governativa do cargo a que é proposta/o?” Caso a resposta seja afirmativa, quem e respetivos dados pessoais, cargo, entidade, data de início e de termo. “Algum membro do seu agregado exerce ou exerceu, nos últimos 3 anos, funções em entidades públicas ou em que o Estado tenha posição relevante?”

Uma das perguntas que mais me choca está elencada no ponto 32: “Tem conhecimento de qualquer tipo de processo judicial, contraordenacional ou disciplinar pendente em que esteja direta ou indiretamente (envolvendo algum dos membros do seu agregado familiar) envolvida/a? (no caso de a resposta ser afirmativa, indicar a natureza e fase do processo).” Qual a relevância de processos judiciais, contraordenacionais ou disciplinares de membros do agregado familiar para avaliar a idoneidade de candidatos a membros do Governo? Que ética na vida pública se constrói com base na devassa da vida de terceiros, incluindo dos seus dados pessoais? Qual a legitimidade do primeiro-ministro para fazer perguntas sobre este tipo de matérias relativamente a pessoas que têm o infortúnio de integrar o agregado familiar de alguém que cai no radar das potenciais escolhas para integrar o Governo?» 


Teresa Violante
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