«Um quinto dos portugueses vive em 133 concelhos com elevada concentração de oferta hospitalar privada. E em 88 desses municípios, sobretudo do interior, a posição dos privados é potencialmente dominante. O alerta é da Entidade Reguladora da Saúde, que descreve com toda a clareza os riscos para os utentes - custos mais elevados, menor qualidade na prestação de cuidados e restrições à liberdade de escolha.
De uma penada, o relatório mostra duas conclusões: a debilidade do Serviço Nacional de Saúde, desprotegendo cidadãos que se veem arredados da sua cobertura, e o círculo vicioso que torna os territórios do interior cada vez menos atrativos. A menos gente vai-se respondendo com menos serviços públicos, mas com falta de serviços de qualidade é ainda mais difícil atrair ou fixar população.
Um dia depois da divulgação deste relatório, outro exemplo demonstrou isto mesmo. O Sindicato dos Trabalhadores dos Registos e do Notariado promoveu o “funeral” simbólico de duas conservatórias, em Góis e Penamacor, desprovidas de funcionários suficientes para evitar o fecho de portas em período de férias. São apenas duas de muitas notícias da semana, a que se poderiam somar alertas do Banco de Portugal sobre a cobertura da rede multibanco ou sobre tantos outros serviços.
O Governo bem pode fazer declarações públicas de amor ao SNS, ao mesmo tempo que promete mais coesão territorial, que no terreno aquilo que vamos vendo é cada vez mais fragilidades e assimetrias. Na educação, na saúde, nas finanças, nos registos, é obrigação do Estado assegurar o acesso a todos os cidadãos. A interioridade não é uma questão geográfica, nem um lugar vago no mapa. É uma condição de fragilidade e abandono sempre que os serviços públicos não dão resposta. O drama é que essa incapacidade é cada vez mais visível.»
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