15.9.24

Vale dos Judeus, para lá da escada

 

«O único debate público que se faz realmente em Portugal sobre o sistema prisional é o das suas condições de segurança. Só se fala de prisões quando há evasões ou quando interessa a alguém que se fale dos telemóveis ou das drogas que entram nas cadeias. Do que não se fala, nunca, é do estado calamitoso do edificado do parque prisional, é da inexistência de uma política de reinserção social minimamente séria e efetiva, é da precariedade da prestação de cuidados de saúde aos detidos e da precariedade de quem os presta, é das celas-camaratas, é do buraco negro de direitos e de legalidade que são as prisões em Portugal.

Há algo de decisivo a montante da discussão sobre o sistema prisional. É que, numa democracia adulta, as prisões deviam ser apenas uma componente – e certamente não a principal – de um sistema de execução de penas em que a privação da liberdade fosse a exceção e não a regra. Se a taxa de encarceramento em Portugal (121/100.000 habitantes) é um pouco superior à média europeia, somos o país do Conselho da Europa em que o tempo de prisão cumprida é mais longo (média de 30,6 meses), mais do dobro da média europeia. Estes números mostram o desinvestimento nas penas alternativas à privação da liberdade e a capitulação social e política perante as tendências de reforço do “músculo” carcerário e até da fragilização de garantias elementares do processo penal. As teses do Direito Penal do inimigo ou, mais genericamente, o senso comum vingativo perfilhado pelo populismo penal, foram fazendo caminho em Portugal e isso é um dos rostos da hegemonia dos ideários anti Estado Social.»

José Manuel Pureza

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