À imagem do que já acontece em Londres, circularão em Barcelona, a partir de 2ª feira, autocarros com o slogan:
«Probablemente Dios no existe. Deja de preocuparte y disfruta de la vida.»
Uma igreja evangélica já reagiu e vai responder com:
«Dios sí existe. Disfruta de la vida en Cristo.»
(Fontes 1 e 2)
Os espanhóis não brincam em serviço: 7,6% dizem-se ateus (versus 3,9% de portugueses que se declararam «sem religião» - agnósticos ou ateus, em princípio - no censo de 2001).
«Probablemente Dios no existe. Deja de preocuparte y disfruta de la vida.»
Uma igreja evangélica já reagiu e vai responder com:
«Dios sí existe. Disfruta de la vida en Cristo.»
(Fontes 1 e 2)
Os espanhóis não brincam em serviço: 7,6% dizem-se ateus (versus 3,9% de portugueses que se declararam «sem religião» - agnósticos ou ateus, em princípio - no censo de 2001).
16 comments:
OK! Mas acho que há um equívoco nestas frases (britânica ou espanhola). Porque, quanto a mim, não é a inexistência ou a existência de Deus que permite ou impede o homem de disfrutar a vida. Existem condicionantes muito terrenas para a possibilidade de um tal disfrutar.
Diria mais: a maioria da população do nosso Planeta não terá em quase toda a sua vida possibilidade de a disfrutar.
E quem a tiver acho que não esperará por saber da existência ou não de Deus para o fazer.
Julgo...
De acordo, Jorge. Mas concorda certamente com a diferença de perspectiva sobre a vida de quem tem, ou não, fé na existência de Deus - para o bem e para o mal.
Concerteza, Joana. Aliás o meu comentário é quase tão polémico e tão incompleto como o são a frase dos autocarros. Isto é, fiz um comentário que pretendeu ser objectivo, quando a subjectividade tem aqui um peso imenso.
Estou convencido que esta campanha pateta, como acção da Nova Evangelização da Europa, é mais eficaz do que qualquer visita papal ou o folclore de alguma congregação ou movimento missionário; seja por revelar que afinal anda por aí mais gente preocupada com a existência ou não existência de Deus do que parece, seja pela fraqueza do «provavelmente», seja pela debilidade da frase, bem denunciada por Jorge Conceição, que acaba por encorajar a pensar melhor no assunto.
Pagamos bem. Acredito que também alguns (poucos) discursos de certo episcopado fazem mais pela ideologia ateísta do que muitos textos disparatados propalados por Associações, blogs e «filósofos» devotos da causa.
Andamos nisto!
concordando com tudo o que diz o jorge conceição discordo de tudo o que diz nuno gaspar.
o encorajar a pensar mais no assunto e o debate é realmente uma força, e não uma debilidade. o mesmo para a palavra "provavelmente". é que ao contrário das igrejas que afirmam peremptóriamente a existência de deus e evangelizam com base num pressuposto de "temor" a deus, uma campanha ateísta nunca o poderia fazer por variadíssimas razões e a principal é a de querer que as pessoas pensem...
aliás, gostava também de poder dizer o pateta que é acreditar num conto de fadas e no pai natal já em idade adulta sem ser acusado de ofender a crença de outros ou de ser odioso.
Este fervor ateísta, além de muito divertido, é estimulante. Ele sabe o que os outros temem e não temem, ele explica o Vaticano às criancinhas, tanta preocupação com a salvação alheia comove. Estava desabituado de ver ao perto uma crença tão militante e empenhada.
Ainda bem que diz querer que as pessoas pensem. Aí estamos de acordo. Um poucochinho menos de preconceito não faria nenhum mal. Ou também achará que quem acredita em mais do que aquilo que vê não pensa?
volá, já começámos a concordar. no entanto creio que a preocupação não será tanto com a salvação alheia e mais com as liberdades individuais.
acredite ainda que sou muito menos militante do que aparento até porque grande parte do que lhe parece empenho é ironia.
o que o nuno gaspar não está habituado é ver ateus e agnósticos afirmarem as suas convicções.
Salvação alheia, liberdades individuais. Coisas antinómicas. Quem deseja a salvação alheia não lhe respeita a liberdade. Quem lhe respeita a liberdade não se ocupa com a sua salvação. É assunto em que cada um cuida de si.
Pensa, exactamente, quem não só acredita para além daquilo que vê, como, mais ainda, nem sequer acredita no que vê. Esse pensa. Por maioria de razão, pensa quem se recusa a aceitar uma religião que lhe é dada como se fosse um primeiro biberão que esse, há que aceitá-lo.
Eu sou ateu e não compreendo estas campanhas de autocarros. Deixam-me como que vesgo. Isso, parece-me absurdo e aqui adopto aquela máxima “a cada um segundo as suas necessidades”. Caberá aos ateus (e, porque não, aos “bons” crentes) a outra parte de tal máxima: “de cada um segundo as suas capacidades”
Estes autocarros são campanha publicitária? Estranho neste caso. Eu sei que tudo se fabrica, que tudo se vende. Hoje, como nunca, se constróem, essencialmente dum exterior, os valores e as diversas subjectividades. Mas fazê-lo de forma tão grosseira no que diz respeito a uma religião?
Eu, como ateu, tenho as minhas dificuldades para aceitar a absoluta imanência de toda e qualquer coisa. Mas não será um cartaz publicitário que me levaria a aceitar um deus qualquer. Aquelas campanhas são uma humilhante certidão de menoridade alheia.
A discussão vai animada e eu sigo.
Mas Zé, esta não entendo:
«Quem deseja a salvação alheia não lhe respeita a liberdade.»
É o mesmo que dizer, por exemplo, que desejar a saúde para os filhos é não lhes respeitar a liberdade.
Não, não é o mesmo. Sobre os filhos há uma responsabilidade. Há uma sua dependência. Desejar-lhe, cuidar da saúde é algo de natural. O seu corpo está ali e tratá-lo e, isto até seria mais sério, cuidar da sua educação, é como comer, dormir, etc. Estrita obrigação que até ultrapassa a responsabilidade paternal. A liberdade não é propriamente um atributo infantil ou juvenil.
A salvação é algo de não natural. É uma construção de determinadas religiões que obriga ao cumprimento de regras. Umas que são morais e que se estendem pela lonjura dos tempos. Praticáveis com ou sem religião. Outras regras serão diferentes e muitas são mesmo inqualificáveis. Bem sei que isto tem evoluído, e quanto!, ao longo dos tempos. Mas a salvação implica uma cosmovisão que é ela própria redutora da liberdade humana.
Salvar, desejar salvar quem quer que seja é interferir no seu processo de livre escolha, de livre informação, de livre formação, de uma autonomia a que todos e cada homem têm direito. Embora possa ter, depois, de pagar por isso. Trata-se doutro plano.
Salvar ou desejar salvar é introduzir, na relação entre as pessoas, pesos institucionais, a Igreja, por exemplo, medos, o da morte, etc., sentimentos alheios ao campo religioso, é levá-las a ver o religioso onde ele não existe, etc. Em resumo, trata-se de uma forma de coacção e, muitas vezes, mesmo duma forma de opressão.
Eu acho que o que José de Sousa quer dizer é que ninguém pode impôr a «sua» salvação (o seu modo de ver a salvação) ao outro, como estes ateístas de pacotilha pretendem (a Fé é uma ilusão primitiva, só há salvação fora da ideia de Deus) ou outrora vários Credos pretenderam (fora da nossa Igreja não há salvação). Se fôr assim, e apesar de já se ter percebido que estamos muito distantes nestas lides, concordo plenamente.
No comentário anterior, em «salvação» leia-se «dar sentido à vida e à morte».
Obrigado por se mostrar de acordo comigo. Só que a salvação, para mim, será dar “um” sentido à vida e à morte e não dar “o” “sentido à vida e à morte”. Não sou exclusivista e entendo que pode haver (ou serem encontrados) os mais diversificados “sentidos” para a vida e para a morte. Religiosos, e aqui, nalguns casos, um estar “bem” para além da morte será também a salvação, ou não religiosos. Embora, no caso do ateísmo, simplesmente ateísmo, admito ou parece-me que ele não comporta qualquer sentido nem para a vida e muito menos para a morte, Que cada um tenha a religião que quiser, mas que todos a tenham num quadro de liberdade e de livre escolha. E também de liberdade e de livre escolha para os outros. O que eu recuso é o peso institucional, ideológico, social, etc. que limitam ou anulam essa liberdade. E isso daria conversa longa que não cabe aqui. Claro que não posso isolar os indivíduos num ambiente asséptico, isentos dos múltiplos “poderes” deste mundo.
Eu, ateu, li apaixonadamente, há dezenas de anos, um livro do Tagore, As Quatro Vozes, em que 4 personagens procuravam e encontravam 4 caminhos diferentes para encontrar Deus. Nunca mais consegui relê-lo porque já não reencontro o que então li.
Se eu recuso qualquer proselitismo que assente numa relação de forças muito desequilibrada, se eu recuso um domínio de poderes que não possa moderar ou contestar, nesse caso, tenho de fazer os meus protestos e reclamar mais liberdade, liberdade e mais liberdade. Quando li o meu Tagore estava numa relação de igualdade. Era livre.
Confesso-lhe que esta campanha pelo ateísmo (e a forma igual que a campanha contrária adoptou) me desnorteia. Julgava que essas militâncias pertenciam às curiosidades do Séc.XIX.
Uma correcçãozita, José de Sousa: o ateísmo militante medrou grande parte do Séc. XX, pois julgo que não falamos somente da Península Ibérica. E a nível estatal. Quer dizer, se assimilássemos o ateísmo a uma religião, então diríamos que estados existiram que foram "confessionais... ateístas".
Como bem diz, se formos analisar este assunto e todas as subjectividades a ele ligadas, teríamos aqui pano para mangas. Por exemplo: como existem crentes (cristãos, hindus, muçulmanos, judeus, etc.) que praticam as suas religiões ou por convicção (opção consciente), ou por tradição, ou "porque sim", etc., existem muitos ateus que o são pelas mesmas razões: por opção consciente, por tradição, "porque sim", etc..
E se nos situarmos no tema sugerido no "post" - o disfrutar da vida porque talvez Deus não exista - então aí as subjectividades são tão díspares que chegam a ser antagónicas. Razão porque acho a frase dum primarismo indesculpável.
Tem toda a razão. E agradeço ter-mo lembrado. Houve um ateísmo militante, o ligado ao chamado “socialismo real” e a quanto se lhe antecedeu. E certamente que algures ainda haverá qualquer coisa de semelhante. Esse “confessional...ateís(ta)”mo, como bem lhe chama, existiu. Não conheço, contudo, nenhum movimento ateísta, que tenha vindo da sociedade civil. No Ocidente, claro, e mais ou menos actual.
Naturalmente, estarei mal informado. E verificar que “ignoro” o que quer que seja é coisa que, ainda hoje, me dá prazer. Uns links que a Joana Lopes pôs num outro post trouxeram-me, e com muito gosto, alguma coisa de novo, de ignorada. Se também o puder fazer, bem lho agradecerei.
Quando lia bastantes coisas sobre a defunta União Soviética, não vi muito sobre a questão religiosa. Além das vulgaridades. E não seria, hoje, capaz de traçar um quadro articulado do que se passou/passava. Poderia meter-me em interpretações, mas seriam fantasias num vazio. Recordo, contudo, de ter lido, numa daquelas publicações de La Documentation Française, a indicação de que era a das Testemunhas de Jeová a maior igreja que se encontrava na URSS. Mais ou menos redigido como escrevi, poderemos entender isso de duas maneiras. Uma muito improvável. Era perseguida, evidentemente.
A frase do autocarro poderá ser primária, mas é significativa. O hedonismo, o prazer, o momento rápido, a falta de memória, o consumo, etc. Isso sim desfrutemos, mas não com Deus a incomodar-nos. Tal, nunca. Para desmancha prazeres já basta o que nos diz a Bíblia. Provavelmente, nem existe. Há frases que ocupam mais espaço do que o da sua simples escrita. É o caso desta. Expõe os nossos tempos (ocidentais) nalguns dos seus aspectos mais significativos.
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