24.9.10

Uma já morreu


Cerca das 21h de ontem (hora local), Teresa Lewis morreu por injecção letal, numa prisão algures na Virgínia. Alegadamente atrasada mental (QI=72), foi acusada de estar na origem da morte do marido e de um filho.

Impossível não pensar em Sakineh. Tudo diferente, tudo semelhante: seres humanos que se sentem com direito de retirar a vida a outros seres humanos.

EUA e Irão – uma mesma derrota, uma enorme vergonha. Não há justificações, não há desculpa. Barbárie.

«Quiero anunciar que todos los comunicados de la República Islámica [sobre el caso de Sakineh], incluido el [de la oficina de] derechos humanos, son falsos y mentira, y que mi madre aún está sentenciada a morir lapidada.»
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7 comments:

Ana Cristina Leonardo disse...

inteiramente de acordo com o paralelismo

Rui Bebiano disse...

Já tinha escrito uma primeira versão deste post: http://aterceiranoite.org/2010/09/25/teresa-e-sakineh/
quando li este teu, Joana. Uma aproximação idêntica já apareceu noutros locais. Como se depreende, concordo com ela mas discordo de um completo paralelismo.

Joana Lopes disse...

Rui,

Que a questão não é linear prova-o o facto de este meu post ter escrito há cerca de 30h, ter neste momento 30 comentários no FB e a discussão não parecer encerrada – não por causa do que eu escrevi mas, precisamente, pelo paralelismo (ou não) entre as duas situações.

Claro que não equiparo a justiça americana à iraniana (por isso escrevi «tudo diferente, tudo semelhante») , mas também não concordo inteiramente com os termos em que estabeleces as diferenças entre os dois casos, no teu post: Sakineh totalmente inocente na cumplicidade da morte do marido? Sei lá… Tens a certeza, para além da desconfiança nas afirmações do governo iraniano e na hipótese, muito provável mas não certa, de ter sido forçada a confessá-lo? Teresa Lewis «culpada confessa», a dois pontos, em termos de QI, de ser considerada deficiente mental (e portanto considerada inimputável pela lei americana): QI=70, quando o dela é =72?

(Para encurtar argumentos, a Inês Menezes é a pessoa com quem mais me identifico na discussão em curso no FB e julgo que a tua se aproxima da do Manuel Vilarinho Pires.)

Já agora: também não vejo bem a semelhança entre este caso iraniano e os «regimes cubano, chinês ou coreano, que equiparam a discordância política ou o dissídio cultural ao crime de delito comum». Trata-se de outro campeonato, não?

Miguel Serras Pereira disse...

Caros,

penso que o RB tem toda a razão. O paralelismo não vai além da pena de morte. Ou do facto de o Irão e os Estados Unidos serem dos países em que as execuções capitais são mais numerosas.
Quanto ao resto, para quem não aceita que a confissão obtida sob tortura seja prova, a presunção de inocência de Sakineh permanece intacta (ver ainda a carta do seu filho sobre a montagem que levou à sobreposição das duas acusações, adultério e cumplicidade em homicídio).
Nada disto deve fazer esquecer a involução (talvez ligeiramente atenuada nos poucos últimos anos, mas sem que a tendência seja estável ou relativamente "adquirida") que levou a pôr termo à moratória dos anos 60 nas execuções capitais em território americano, nem a urgência de combater, também na Europa, a dinâmica da transformação em Estado penal - ou Estado-Penitência - do "Estado-Providência" a que assistimos com o triunfo do neo-liberalismo e na qual os Estados Unidos desempenharam um papel de vanguarda.

msp

Joana Lopes disse...

De acordo, Miguel, o paralelismo é esse e já não é pequeno.
Repito: não comparo a «justiça» iraniana à americana, mas, para além da pena de morte ser sempre odiosa, o desta TL é especialmente chocante, a ser verdade que roçava o debilidade mental.

Miguel Serras Pereira disse...

Nem mais, Joana. E a pressão regressiva da barbárie é assustadora nos Estados Unidos: salões de exposição/promoção de adereços prisionais, sugestões no sentido de transmissão televisiva das execuções, o acesso dos familiares das vítimas ao espectáculo da execução (entendido como ressarcimento ou compensação da perda sofrida e configurando uma reabilitação judicial da vingança privada), etc., etc.
Por cá - Europa - ainda não fomos tão longe, mas os advogados do endurecimento penal, propondo ocasionalmente o restabelecimento da pena de morte, levantam cada vez mais a cabeça.

msp

Joana Lopes disse...

Exactamente, Miguel, a tendência securitária, na Europa, não anuncia nada de bom.