11.10.10

Nobel da Paz, PCP e temores chineses


«Face a solicitações de vários órgãos de comunicação social sobre a atribuição do prémio Nobel da Paz deste ano, o PCP divulga o seguinte:
A decisão da atribuição do Prémio Nobel da Paz a Liu Xiaobo – inseparável das pressões económicas e políticas dos EUA à República Popular da China - é, na linha da atribuição do Prémio Nobel da Paz de 2009 ao Presidente dos EUA, Barack Obama, mais um golpe na credibilidade de um galardão que deveria contribuir para a afirmação dos valores da paz, da solidariedade e da amizade entre os povos.»

Quando tudo parece ter limites, o PCP consegue ainda surpreender.

«If Liu [Xiaobo]’s calls for a multi-party democracy in China were followed, a commentary in the paper said: "China’s fate would perhaps be no better than the former Soviet Union and Yugoslavia, and the country probably would have quickly collapsed"»

Para evitar palavrões: Oxalá! Deus é grande, etc., etc., etc.
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6 comments:

Helena Araújo disse...

Há 10 anos, quando estava a preparar uma viagem à China, li num livro essa explicação para a violenta reacção contra os estudantes. Era muito lógico: a China é um país demasiado grande para poder fazer experiênciazinhas democráticas. Se começam a experimentar, é o caos. Por isso, para bem do povo, o regime tem de manter a ordem com mão forte.

O chinês que ia connosco - e que conseguira ir morar para os EUA mas fora obrigado a esperar muitos anos até a China autorizar a saída da sua família - riu-se muito. É que não conseguia parar de rir.

Sebastião Torres disse...

” os êxitos inegáveis da China e os objectivos socialistas que Pequim se propõe alcançar são as razões que justificam a campanha internacional contra a política chinesa…”
Albano Nunes do secretariado do PCP, aquando da visita à China em Maio de 2008.

Portanto,mais do mesmo quanto à apreciação do PCP sobre o Nobel da Paz.

Pinto de Sá disse...

É na verdade divertido, mas coerente. Entretanto permitam-me fazer um pouco de advogado do diabo, para aumentar a piada do tema:
- A posição chinesa sobre a democraca burguesa faz todo o sentido. Num Império centralizado e unificado como aquele, multi-milenar, não faz qualquer sentido dissipar tal legado civilizacional por um sistema de poderes multipolares. Isto porque, não havendo na realidade variedade de opiniões que não possam estar contidas no PCCH, uma multipolaridade de poderes só poderia ter um caracter étnico e corresponder a uma fragmentação regionalista! Tal como acontece em toda a África, por exemplo!
Ora porque havia um Império centralizado e multi-milenar dissipar assim o seu legado?
Na verdade o Império do Meio é aquele que construiu a muralha da China estava o Império Romano ainda bem. No Ocidente os romanos sossobraram e veio daí a resultar o que se sabe; na China isso pôde ser evitado, e querem agora os ocidentais que eles de desmembrem? Wishful thinking...
Naturalmente que o país precisou de fazer uma revolução burguesa, acabando com o feudalismo rural e a dependência do estrangeiro. Foi o que fez o camarada Mao, mas isso não mudou o caracter imperial do país, tal como a revolução burguesa francesa não impediu a emergência de Napoleão, nem a República portuguesa impediu o advento do Estado Novo! Os países têm as suas tradições profundas...!

Joana Lopes disse...

Pinto de Sá,
Comentário importante e que vai ao âmago da questão.
MAS: mesmo que o carácter imperial permaneça, isso não significa a sobrevivência do império tal como ele é. E estas intolerâncias prejudicam a eficácia dos chineses, num mundo bem diferente daquele que o camarada Mao encontrou, e que eles querem dominar «comercialmente».
Conseguirão alterar «umas coisas» sem várias implosões internas? A million dollars question...

Pinto de Sá disse...

Joana, talvez eu esteja errado, mas tal como vejo as coisas a China não quer dominar o mundo "comercialmente". Sabe que isso é facilmente bloqueável se acontecer um problema e que o poder continua a estar, como dizia o camarada Mao, "na ponta das espingardas".
O que a China quer é evitar o cheque-mate em que a URSS caiu: ou desenvolviam a economia e sacrificavam os gastos militares, ou procuravam a supremacia militar e exauriam a economia. Como se sabe, chamou-se a isto "Guerra Fria" e a URSS perdeu-a.
Assim, e com paciência de chinês, resolveram dedicar 20 ou 50 anos ao desenvolvimento da economia, enquanto infra-estrutura essencial a uma supremacia militr sustentável, e até lá não fazem ondas. E ao mesmo tempo vão desenvolvendo a infra-estrutura tecnológica militar - desde a espionagem dos silos nucleares americanos até à cyberguerra, passando pelo domínio dos mísseis intercontinentais, como a aposta na ida à Lua comprova (a corrida ao espaço serve essencialmente para apurar a tecnologia dos ICBM, razão porque parou com a Guerra Fria).
O que distingue a China nisto, na minha opinião, é precisamente o pensarem a 20 ou mais anos. Quer dizer que os dirigentes não pretendem resultados para si próprios, pois já cá não estarão para os ver, mas sim para a História e a pátria deles. Verdadeiros comunistas, portanto... :-))

Pinto de Sá disse...

Diria ainda: a "revolução democrática popular", enquanto formula chinesa, pode traduzir-se nisto: revolução burguesa (á francesa) dirigida pelo Partido único. Ou melhor ainda: revolução burguesa dirigida pelo próprio centro imperial (mudando de dinastia, mas isso foi coisa corrente na História chinesa)!
Só espero sinceramente que se acabe por arranjar uma fórmula de inter-dependência e amizade estável com o Ocidente (o que talvez requeira que este se não desarme, nem militar nem economicamente), senão lá teremos a Terra como mais um exemplo de que a vida, quando atinge o estádio de civilização tecnológica, se auto-destrói...