1.4.11

A estratégia da aranha

@Gui Castro Felga

No incontornável «A Areia dos Dias», um texto importante de Manuel Brandão Alves: A estratégia da aranha, os mercados financeiros, as agências de rating e o mais que se verá.

«Já viram o que é que faz a aranha quando as moscas andam por perto e se deixam apanhar pela teia? Salta-lhes em cima e suga-as até que reste, apenas, o revestimento exterior. Mesmo que não gostemos das moscas, este espectáculo é, mesmo assim, cruel. No entanto, vale a pena observar este comportamento da natureza, porque observá-la nos permite aprender muito sobre os comportamentos humanos e suas instituições.

O que faz a aranha? Começa por construir a teia e depois de ela estar terminada, recolhe-se a um esconderijo e aí espera que as moscas distraídas aterrem na teia, onde permanecerão presas sem qualquer possibilidade de se libertarem, pois quanto mais se mexem, mas presas ficam. É nesse momento que a aranha sai, a grande velocidade, do esconderijo, se precipita com o seu aguilhão sobre a mosca e lhe suga tudo o que possa existir dentro da sua carapaça.

Há, contudo, uma situação em que a mosca consegue evitar a prisão da teia. Consiste, apenas, em não se deixar prender por ela e isso é possível. Nas madrugadas húmidas, os nós da teia ganham gotículas que, com os raios de sol, ao nascer da aurora, tornam a teia mais visível e, por isso, menos capaz de captar moscas.

A estratégia da aranha só é aqui invocada para que compreendamos, melhor, a estratégia dos designados “mercados” financeiros, face à mosca que somos nós, Portugal. A postura dos mercados financeiros, hoje, perante Portugal é muito semelhante à da aranha: estão dispostos a sugar-nos até ao tutano e, como nos já deixamos enredar pela sua teia é, agora, difícil dela nos libertarmos. (…)

Temos ouvido falar muito da Standard & Poors, da Fitch e da Moody’s. De onde vêm tais instituições? Foram criadas para prestar serviços de análise e aconselhamento sobre a sustentabilidade dos projectos em que os investidores poderão vir a realizar aplicações financeiras. A Standard & Poors, por ex., surgiu em meados do Séc. XIX, para ajuizar da razoabilidade de aplicações financeiras na construção de caminhos-de-ferro nos EUA. Não são, por isso, nos mercados, organizações independentes.

Foi assim no passado e é sensivelmente a mesma coisa hoje, com um pormenor que importa referir: baixou a rentabilidade dos investimentos na economia real (fim de ciclo do fluxo de inovações) e os “mercados” passaram a privilegiar as aplicações financeiras. Como há muito maior desigualdade entre quem precisa de financiamento e quem o oferece, a aranha faz o que tem de fazer: suga a mosca. (…)

Não é fácil sairmos da teia em que nos deixamos cair. Na situação a que chegamos, não restam muitas alternativas: ou se recorre aos Fundos, ou se faz a reestruturação e o resgate da dívida, ou se sai do Euro. Imediatamente, qualquer das opções será muito dolorosa, mas nem todas têm as mesmas virtualidades futuras.

Porventura, o único caminho viável será o de, como a mosca, apenas voar quando surgir a “nova aurora”. Aranha também pouco faria sem a teia!

E o que mais se verá? Provavelmente que a aranha vai ver se apanha outro na teia, talvez a Espanha.

Atenção que nada disto é mentira!»

Na íntegra aqui.
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