Um texto de José Manuel Pureza. (Os realces são meus.)
Os Governos europeus reconheceram o que era evidente: a teimosia em não aceitar a reestruturação da dívida grega não era cegueira, era mesmo estratégia deliberada de provocação da bancarrota. E a reestruturação aí está, depois de tantas juras de que nunca aconteceria. Bruxelas entrou no caminho da razão? Não, não entrou. Porque cedendo aqui, manteve o essencial da sua fidelidade à ortodoxia penalizadora das economias. É verdade que os juros deixaram de estar num patamar de agiotagem declarada. É verdade que os prazos de pagamento da dívida foram alargados. Mas o Conselho Europeu deixou duas mensagens claras, ambas erradas e ambas sombrias para as economias e as sociedades da Europa.
A primeira é a de que os programas de austeridade não serão beliscados. O que Bruxelas nos está a dizer é que a recessão se mantém como horizonte desejado para as nossas economias e que as privatizações baratas dos bens comuns se mantêm como receita. Emagrecer a parte da economia que se relaciona com a grande maioria das pessoas e engordar até à obesidade mórbida os que mais têm – eis o credo desta governação económica da União Europeia. Empobrecer as sociedades e retirar pressão aos direitos e aos salários é o seu programa político. Não fossem os portugueses acreditar que finalmente a União Europeia tinha reconhecido a necessidade de respirar de quem trabalha, Passos Coelho apressou-se a advertir que não haverá abrandamento do programa de austeridade do Governo. “Antes pelo contrário”, sublinhou. Os boys da direita com guia de marcha para as prebendas públicas e os titulares de dividendos isentos do imposto que vai subtrair metade do subsídio de Natal aos trabalhadores e à classe média podem dormir descansados. Nada se alterará. A Europa assim manda.
A segunda mensagem é a de que, aceite para a Grécia, esta reestruturação não será aceite para mais nenhum Estado membro. Novo erro. Porque mostra que Bruxelas insiste em segmentar uma crise que é europeia e não de cada país. A lógica traduzida na insistência em que “a Irlanda não é a Grécia”, “Portugal não é a Irlanda” ou “Itália e Espanha não são Portugal” foi sempre uma lógica armadilhada. À Esquerda cabe desmontar o engodo nacionalista desta lógica e contrapor-lhe que, diante dos ataques sem fronteiras contra os salários e os direitos, nós somos portugueses, mas somos também gregos, italianos ou irlandeses. E, já agora, também somos alemães.
(Daqui)
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1 comments:
Hoje estive a ler e a ouvir, fados do Cancioneiro do Niassa, eram fados de alguém que como eu sofria amargamente longe dos seus. Só quem passou por esses momentos, que mais tarde originaram o chamado stress de guerra, é que pode compreender naquela frase descontrolada do assassino, todo o rancor que lhe ia na alma. Não sei como nós, ex-combatentes, com as nossas sequelas, ainda aguentamos, um governo após um desgoverno, que também desgoverna. Como diz Dom Januário Torgal, Bispo emérito das Forças Armadas Portuguesas:-Há muita miséria e muita fome camuflada em tanta alma penada, que como eu consegue ainda amparar os filhos que Deus me deu; só Ele sabe até quando e desta minha alma de alentejano que sai este grito:
UM GRITO
Morreram eles todos num só dia
o desse polícia, um assassino
retira da Noruega, a alegria
tal como se fosse um asinino!
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e morte com ela sempre trás
nojo, luto e incontido rancor
a morte desses jovem, capaz
não digo de represália, é dor!
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O destino marcado nessa ilha
ruiu sonhos, matou felicidade
um sonho que seria maravilha;
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esmagado por uma morte atroz
grito quem sabe, o da liberdade
a d'hoje foi dele, amanhã de nós!
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Eugénio dos Santos
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