5.12.12

Do Senhor Milagroso



Estou desde ontem em Cali, terceira cidade da Colômbia, dançarina por excelência (serão daqui os campeões mundiais de salsa, que vi ontem em ensaios), no meio de plantações de cana-de-açúcar a perder de vista. Estranhamente, 70% da população é negra ou mestiça. Ou talvez não: trata-se de uma herança do tempo em que multidões de escravos, trazidos de África, aqui vinham parar precisamente para se ocuparem da dita cana-de-açúcar.

A umas dezenas de quilómetros, encontra-se Buga, centro de peregrinação à Basílica do Senhor dos Milagres. Com uma fé aparentemente à prova de balas, para aqui convergem colombianos de todas as paragens, que fazem promessas e agradecem benesses. O «Museo del milagroso» é extraordinário: milhares de placas forram longas paredes de várias salas, com agradecimento de todas as espécies.

Mas o mais curioso, e muito ingénuo, é o conjunto de «ex-votos», objectos que «pagam» desejos realizados, como tantos que se vêem em Fátima e que aqui enchem vitrinas. Destaco dois exemplos: uma placa em que um bebé, agora com um mês, fala na primeira pessoa e agradece ter sobrevivido, apesar de prematuro, e diz estar já «forte e bendito»; e um casaquinho de recém-nascido com um letreiro em que os pais estão gratos por o filho ter nascido com os cinco sentidos…

Santa inocência que refresca a alma e ajuda a esquecer, por uns dias, os sonhos molhados do doutor Gaspar e os dislates do senhor Borges.


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