Do Editorial de Le Monde Diplomatique (edição portuguesa) deste mês, por Sandra Monteiro.
«Chegamos a Abril com uma dupla urgência. Por um lado, reconstruir as formas de organização da sociedade que, desde a instauração da democracia, vinham mostrando ser as mais capazes de melhorar as condições de autonomia, igualdade e liberdade da grande maioria dos cidadãos (Estado social e serviços públicos, direitos e leis laborais, políticas de coesão territorial). Por outro lado, construir as formas de integração, europeia e internacional, da economia e das instâncias políticas do país que melhor possam reverter o rumo de empobrecimento e subdesenvolvimento prolongados para o qual estão a ser empurrados cada vez mais países de uma União Europeia disfuncional e, dentro de cada país, um crescente número de cidadãos das classes médias e populares.
Chegamos a Abril com uma dorida certeza. Ela cresce a cada revelação da escalada dos números do desemprego, da precariedade e da pobreza, bem como do défice e da dívida. Que certeza é essa? A de que não haverá um fim para esta crise, e muito menos um fim benigno, com este ou qualquer outro governo que decida, com semblante convicto ou contrariado, impor políticas de austeridade, aceitar as condições de financiamento ditadas pelos credores e abdicar de reivindicar os instrumentos – nacionais e europeus – de política económico-financeira que permitam governar a favor da maioria dos cidadãos. Um governo que não actue simultaneamente na recusa da austeridade, na reestruturação da dívida e na colocação de condições de arquitectura europeia não conseguirá resultados muito diferentes dos actuais. E à crise económica e social, com todos os fenómenos de corrosão e disfuncionamento que ela traz a uma comunidade, só juntará uma crescente crise política. Quanto tempo pode a democracia resistir à constatação, muito agudizada pela crise, de que nos lugares de decisão não há quem represente os interesses dos cidadãos, mas apenas os dos credores financeiros? Quantas vezes poderão os governos, em campanha ou em funções, afirmar que defendem valores e princípios que garantiriam uma vida digna aos povos, se não consubstanciarem essa defesa em políticas que melhorem as condições materiais de vida? E o que vamos nós fazer para que esta crise da democracia representativa resulte num aprofundamento da democracia e não no seu contrário?»
(Continuar a ler aqui.)
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