Cheguei com o livro a casa e li-o todo, da primeira à última página. A obra de Joana Pereira Bastos, que agora chegou às livrarias e que será lançada em Lisboa no próximo dia 23, propositadamente em vésperas de mais um 25 de Abril, fala-nos de quem se encontrava nas prisões da PIDE em Abril de 74, da violência então vigente na actuação daquela polícia política, da longa espera pela libertação dos presos, que só ocorreu já nas primeiras horas do dia 27.
JPB, que é uma jornalista de 33 anos, bisneta de Maria Lamas, não pretende abordar o tema como historiadora que não é, mas sim transmitir o que ouviu em muitas horas de entrevistas, sobretudo para que a sua geração não continue a desconhecer a acção daqueles a quem deve, em grande parte, a liberdade em que nasceu e se tornou adulta.
Em 1973 e 1974, a PIDE prendeu mais de 500 pessoas, acusadas de activismo em vários movimentos políticos e de diferentes classes sociais – para além de militantes do PCP, maoistas, trotskistas, católicos progressistas, membros de organizações ligadas à luta armada, como a LUAR (Liga Unitária de Ação Revolucionária), a ARA (Acção Revolucionária Armada) e as BR (Brigadas Revolucionárias). Com as prisões a abarrotar e confrontada com organizações e métodos que não conhecia, a PIDE reforçou a violência e a tortura tornou-se, mais do que nunca, o meio trivial de obter confissões.
Declaração de interesses, antes de avançar. Se não conheço pessoalmente a autora, os seus pais, tios e dezenas de amigos comuns fazem parte da minha vida há décadas. Mais: das pessoas entrevistadas para o livro, três são meus amigos íntimos, vivi de perto o drama das suas prisões e de tudo o que no livro é relatado. Estou a falar de Nuno Teotónio Pereira e dos irmãos Maria da Conceição e Luís Moita. Faltar-me-á talvez por isso alguma distância crítica – que nem me interessa ter, confesso – em relação às 180 páginas que acabei de «digerir».
A leitura das descrições de algumas torturas deixou-me de novo transida, apesar de as conhecer praticamente desde que aconteceram. E porque não me apetece poupar quem ler este texto, reproduzo duas páginas do livro, com uma parte – só uma parte – do que se passou com Luís Moita. Sem comentários.
(Clicar para ler)
Os capítulos mais interessantes do livro são talvez aqueles em que é pormenorizadamente descrito tudo o que precedeu a libertação daqueles que estavam em Caxias no dia 25 de Abril de 1974, desde a total ignorância do que tinha acontecido, ao medo de que se tivesse tratado de um golpe de direita, de que os agentes da PIDE se vingassem e os liquidassem, à longa espera da decisão da Junta Nacional, que permitisse a libertação de todos, como exigiram depois de saberem que se punha a hipótese de ela ser selectiva.
Um livro que é sem dúvida um marco para que seja salvaguardada a memória da ditadura e dos seus horrores, mais do que oportuno neste momento tão difícil da vida de todos nós.
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