5.7.14

«Ganhar tempo»



Gustavo Cardoso, no Público de hoje:

«Se ganhar tempo é o que passámos o tempo a fazer nos últimos três anos na Europa então, em Portugal, estamos mesmo “lixados com um F grande” ou, pelo menos, é isso que se depreende do relatório apresentado na quarta-feira pela OCDE “Grandes desafios de política dos próximos 50 anos, um novo rumo a tomar”.

“Ganhar tempo” é a expressão que costumamos utilizar para definir a não acção ou o interregno em que se acha que devemos esperar até chegar o momento certo, porque o sucesso do empreendimento não depende de nós. “Ganhar tempo” é um instrumento político, mas não pode ser a norma do exercício político.

Onde se observa hoje o “ganhar tempo”? Observa-se no BCE, ao inundar a Europa com euros (embora por via indirecta). Observa-se na gestão dos próprios bancos, ao elegerem-se a si mesmos como principal destinatário da ajuda e não as empresas nacionais. Observa-se nas lutas partidárias, centradas nas imagens dos candidatos e não na discussão de ideias ou programas de acção. Observa-se nas diferentes governações dos últimos três anos em todos os países do euro, ao apostar no gerir o que temos e não arriscar em fazer novo. (...)

Os tempos que se avizinham não são tempos de "ganhar tempo", mas sim tempos de escolher governar e mudar.

Para os estados nacionais há também duas opções claras no que respeita à justiça social. A primeira opção para os estados é seguir o actual caminho de incapacidade de controlar a mobilidade e, portanto, deixar de taxar as maiores empresas e os trabalhadores de maiores rendimentos. Isto é, aqueles que são mais móveis internacionalmente e menos enquadráveis pela fiscalidade nacional. (...)

A alternativa é menos fácil, mas é tanto possível quanto mais justa. Uma cooperação regional e, progressivamente alargada, ao nível das taxas base de imposto praticadas para empresas com potencial de internacionalização e para trabalhadores especializados de elevada mobilidade.

E, por fim, algo que a OCDE não quer encarar como solução mas que cada vez mais surge como inevitável, pelo menos no caso português, uma maior taxação do património financeiro individual ou empresarial acima de, pelo menos, um milhão de euros e dos rendimentos salariais dos ultra-ricos, incluindo complementos salariais. (...)

Só resta fazer a pergunta-chave aos diferentes protagonistas que se estão a alinhar para as eleições legislativas de 2015 e comparar respostas: vens para governar ou para ganhar tempo?»

(Link acessível para alguns.) 
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