Crónica de Diana Andringa, hoje, na Antena 1:
Em 1983, no âmbito de uma reportagem sobre refugiados, fui com dois camaradas de trabalho filmar no Japão. Paulo Rocha, então adido cultural da Embaixada Portuguesa em Tóquio, teve a gentileza de nos ir esperar ao aeroporto de Narita.
Cineasta, sabia bem como são complicados os movimentos de quem transporta dezenas de quilos de material de gravação – mais ainda numa terra estranha, de que se desconhecem não apenas a língua, mas o próprio alfabeto.
Com extraordinária solidariedade, levou-nos ao hotel e esperou, pacientemente, que recuperássemos o suficiente para nos levar a jantar. Cansados da longa viagem desde o México, não podíamos, naturalmente, recusar o convite que nos dirigira. Nessa noite contactei, pela primeira vez, com a gastronomia japonesa. Apresentada por alguém que a conhecia e apreciava, rapidamente se tornou uma das minhas favoritas. Mas, de regresso a Portugal, cada vez que o referia alguém me respondia: «Que horror, peixe cru!»
Três décadas depois, os restaurantes japoneses tornaram-se habituais entre nós e são muitos os portugueses que os frequentam.
Lembrei-me desse primeiro jantar japonês a propósito do debate que por aí vai em torno do serviço público de televisão, futebol, cultura e audiências. E de o sociólogo francês Dominique Wolton ter dito em 2000, numa entrevista na RTP2, que «a audiência não traduz o estado da procura, é um reflexo da oferta».
Wolton não pensava em comida japonesa, mas em televisão. E acrescentou: «Se um político só repete o que as pessoas dizem, trai a sua missão. Se um industrial só produz o que a procura pede, trai a sua missão. É sempre preciso preservar a lógica da oferta face à lógica da procura. A emancipação está do lado da oferta, não da procura.»
Se o sashimi e a açucarada água suja do imperialismo primeiro se estranham e depois se entranham, não se poderá dar o mesmo com a cultura? Porque é que só funciona com o futebol e a NBA?
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