«A recente morte de Manoel de Oliveira e de Herberto Hélder, que motivaram horas de abertura nos telejornais televisivos e a semântica do nada dos políticos pesarosos, poderiam dar a noção que Portugal é um País sitiado pela dívida e pelo défice, mas florescente em termos culturais. Um equívoco. O panorama televisivo, onde a generalidade dos portugueses bebe o seu conhecimento, é revelador da mediocridade reinante. A cultura portuguesa serviu sempre como medalha da classe política em tempos eleitorais, perante a própria comiseração dos criadores, muitos deles a encararem a produção cultural como uma obrigação única do Estado. (...) Os homens falam mais a partir de "smartphones" do que entre si, as frases foram substituídas por "slogans" no Twitter. As leituras são superficiais e feitas na internet. O património só é encarado em termos de lucro turístico. Nada que admire: as nossas elites são há muito um exemplo de falência cultural. (...)
Numa era em que a sociedade de emprego desapareceu (mas ainda se finge que é um desígnio político), em que a economia de mercado foi substituída em parte por uma economia especulativa, em que a sociedade de consumo foi transformada num fosso em que os que têm muito consomem pouco e os que desejam o consumo não têm dinheiro para o fazer, a cultura deixou de fazer parte das prioridades. Porque é-se alguém de sucesso pelo que se tem, não pelas ideias que traz ou partilha. (...)
A fraca inteligência da elite política nacional, pobre até na forma como se despediu de Manoel de Oliveira e Herberto Hélder, mostra o desastre em que vivemos. Tudo ficou exemplarmente explicado quando o ministro Aguiar-Branco disse, sobre a morte de Silva Lopes, que "era uma felicidade ter partido no mesmo dia de Manoel de Oliveira".»
Fernando Sobral
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