10.10.15

A surpresa



«O PS não foi sozinho alternativa – e Costa não resolveu o problema. Ao contrário do que se assegurava há um ano, o pólo de atracção do protesto não foi António Costa. O PS ganhou apenas 180 mil votos (de 28% para 32,4%). Juntamente com a derrota de Sócrates em 2011, o PS continua com os seus piores resultados desde 1991 (segunda maioria absoluta de Cavaco). Os partidos do “arco da governação” (ou, pelos vistos, da NATO, segundo Cavaco...) continuam em queda: no seu conjunto (PS, PSD, CDS) obtêm o resultado mais baixo desde 1985. O problema, portanto, não está nos líderes, não estava em Seguro, nem sequer em Costa. Era bom que os cultores das lideranças, tão de moda, que parecem julgar que o mundo se resume a uma leitura de marketeiro, reconhecessem que os eleitores também votam em ideias, em atitudes, o que explica que um milhão de portugueses tenham votado no BE e na CDU sem que precisassem de sentir que votavam Catarina Martins ou Jerónimo de Sousa para Primeiro-Ministro. Os socialistas deveriam tentar perceber porque é que uma grande parte dos eleitores já não acredita (e de forma que parece consolidar-se) na alternância sem alternativa, no slogan de “só nós conseguimos pôr de lá para fora os que lá estão”, como ocorreu em 2005 (em seu favor) e em 2011 (contra o PS).

Afinal, isto virou mesmo à esquerda! E essa foi a surpresa destas eleições. Enganou-se quem, com a habitual ligeireza, desvalorizou o ciclo de maior contestação social dos últimos 30 anos, e achou que a esquerda “radical” bem podia sair à rua, convocada pela CGTP ou pelo Que Se Lixe a Troika!, porque, uma vez chegadas as eleições, todos voltariam ao redil e votariam nos “suspeitos do costume”. É ou não significativo que o BE tenha duplicado a sua representatividade depois de o terem declarado morto e, pelo contrário, quem, como o Livre, reclamava uma “esquerda de governo” e criticava a “esquerda de protesto”, tenha saído arrasado das urnas, perdendo metade dos poucos votos que obtivera para o Parlamento Europeu? É ou não significativo que a CDU, apesar do voto útil no PS e dos 260 mil novos eleitores do BE, tenha ganho mais apoio (sobretudo no Norte) pela 4ª eleição consecutiva?

Quem quis mudar a sério foi à esquerda do PS que confiou o seu voto: 1.113 mil votos (+315 mil), 20,7% de quem foi às urnas, constituem hoje um bloco sociopolítico (plural, como tudo na sociedade) de quem continua, apesar de toda a pressão das sondagens a favor do “voto útil”, a não confiar nos socialistas para fazer a mudança. (...)

Os que se mostram horrorizados com a possibilidade de um acordo de mínimos à esquerda denunciaram anos uma “esquerda do bota-abaixo” que, ao contrário de outros países, não contribui para a “governabilidade”. Deixaram-se surpreender com a frontalidade com que o PCP e o BE mostraram abertura para viabilizar um governo do PS para impedir o regresso da direita, não fazendo mais do que aquilo que disseram toda a campanha: que os seus votos não faltariam para procurar uma solução contra a continuação do que temos. O PS sabe que esse é o pressuposto básico de uma mudança. De um mínimo de esperança.»

1 comments:

Fenix disse...

Agora que estão reunidas as condições para a mudança, e não alternância, vemos o PS a ziguezaguear como uma barata tonta, sem saber muito bem o que fazer, tendo em conta a clientela a que tem que agradar! PS e PSD são duas faces da mesma moeda!