15.6.19

Renovar a Europa



«Esta Europa diz querer-se autónoma e unida. Depois de ter falhado a união por via de políticas que servissem efetivamente as suas populações, as lideranças europeias passaram a buscá-la noutras miragens. Trump foi eleito presidente nos Estados Unidos e não foi preciso muito tempo para se "encontrar" esse desígnio: o melhor remédio para unir-nos seria o de reforçar uma alternativa à NATO. Como? Trabalhando para um exército comum. Foi com determinação que, no plenário de Estrasburgo, a chanceler Angela Merkel o pronunciou com todas as letras. Foi também com pompa e circunstância que Emmanuel Macron se fez ouvir defendendo a ideia de um exército europeu como forma de redução da dependência dos Estados Unidos na defesa.

Apesar de várias críticas e dúvidas substanciais, lá se foram alinhando uns e outros, juntando-se países e, mesmo que não fosse na forma de exército, foi-se construindo o que se quis transformar numa ideia feita: "Com Trump de um lado e um Brexit aqui, será mesmo a política de defesa que nos vai unir." Nunca o antimilitarismo ou a solidariedade internacional foram postos na equação, já que isso não é coisa que alimente negócio.

Esta narrativa assim contada não deixa, contudo, tapar muitas das falhas que ajudam a que esta ideia seja mesmo e cada vez mais só o espelho da falta de um projeto para a União. Desde logo, não se pode apagar que a França tenha regressado ao comando militar da NATO há cerca de dez anos e, com isso, procurado reafirmar a sua posição de potência nuclear. Em segundo lugar, quando os Estados Unidos procuraram destruir o acordo feito com o Irão, que seria uma forte peça no caminho necessário para um verdadeiro mecanismo de desnuclearização internacional, a União Europeia ficou no meio da ponte e não jogou o que poderia ter sido o seu papel fundamental para o nosso futuro comum, ao lado da paz. E terceiro lugar, assistimos nesta semana ao primeiro episódio para pôr fim à veleidade de autonomia militar europeia no acordo firmado entre a Polónia e os Estados Unidos. Donald Trump encontrou nos polacos a plataforma que precisava para voltar a pôr a NATO no centro da política europeia de onde nunca saiu efetivamente. Uma base militar a sério, um negócio para a compra de armamento norte-americano e o contentamento de Stoltenberg fazem o resto da fotografia. O eixo franco-alemão vive cada vez mais de rótulos que dizem pouco a muitos, e para os quais a Polónia se está a borrifar, e a União Europeia da incapacidade de escolher o lado certo: nem NATO nem exército comum.

Enquanto isto se passa, negoceiam-se no Parlamento Europeu as novas configurações políticas. A extrema-direita unida para as eleições manteve a divisão de poder no Parlamento. Macron lá criou o seu grupo parlamentar Renovar a Europa, não se sabe ainda bem para que propósito. Socialistas e verdes aguardam os termos da grande coligação para supostamente afrontar a extrema-direita. E de política? Zero. A paz pode esperar.»

.

0 comments: