11.3.20

Há um plano de emergência para o vírus da crise económica?



«Com milhões de pessoas fechadas em casa um pouco por toda a China e a atividade económica reduzida ao mínimo, a fábrica do mundo está fechada. Só como exemplo, Shandong, cidade que acolhe refinarias responsáveis por um quinto das importações de crude chinesas, está praticamente parada. Monstros comerciais e industriais estão paralisados. Os efeitos económicos vão ser colossais. O Japão (os Jogos Olímpicos estão em risco), a Coreia do Sul e grande parte da Ásia estão a ser fortemente afetados. Pensem noutras crises, como a causada pela implosão do mercado imobiliário nos EUA, e facilmente perceberão que é pouco ao pé do que se pode avizinhar. Uns idiotas, na Europa, nos EUA e em Portugal, chegaram a especular sobre as vantagens económicas da crise na China. Não lhes ocorreu que antes de cá chegarem os clientes perdidos pela China viria o próprio vírus.

Esqueçam a Ásia. Pensem na Europa. Em Itália, em estado de sítio e fechada. Na Alemanha lenta, em Espanha em pânico. Imaginem o efeito de milhares e milhares de pessoas em quarentena, de empresas a meio gás, das escolas e universidades fechadas, da redução do consumo. Toda a economia europeia disfuncional. Prolonguem isto por meses. Imaginem que impacto terá na economia.

Esqueçam a Europa. Fiquem só em Portugal. Nem precisam de pensar em tudo o que vai funcionar pior ou na despesa pública que será necessária para travar o vírus. Ainda pouco aconteceu e a pressão política (ou aproveitamento político, depende do ponto de vista) já começou. E é quando isso acontece que se tomam decisões absurdas e irracionais para acalmar jornalistas e opiniões públicas mais impressionáveis.

Mas esqueçam a economia em geral. Pensem apenas no turismo, em que baseámos grande parte da nossa recuperação, apesar de tantos avisos sobre a enorme fragilidade dessa escolha. Bastaria um atentado para deitar tudo por terra, disse-se. Não nos lembrámos de um vírus. Não precisam de grande esforço para imaginar nada. A Bolsa de Turismo de Lisboa foi adiada para maio. Querem maior sinal do que vai acontecer do que o que é dado pelo próprio sector? Só nos resta rezar para que isto passe antes do verão.

Acho que já perceberam o meu ponto. Vem aí uma crise económica. Como anunciam as bolsas em queda a pique, vem aí uma brutal crise económica. Enquanto tentamos travar o vírus com os instrumentos que temos, sacrificando a economia em nome de vidas ou da segurança – escolha mais do que compreensível –, há quem tenha o dever de preparar a ressaca económica do coronavírus. A Europa já deu sinal de que será tolerante com derrapagens orçamentais que resultem do combate à epidemia. Não vos digo que é pouco. Digo-vos que é nada. Que é quase um insulto. A Europa tem de preparar uma resposta coletiva a isto, não deixando de novo, como fez com a crise de 2008, cada um sozinho a enfrentar, com instrumentos naturalmente diferentes, a crise que se avizinha. Para descobrir, no fim, que se tivesse agido a tempo teria evitado uma crise à escala continental. A metáfora do esforço coletivo para conter o vírus é excelente para não repetir os erros de 2008. Não se deixa instalar o pânico, esperando que a maleita destrua os que têm menos defesas. Faz-se um esforço coletivo para conter a epidemia. A Europa tem de começar já a discutir um plano europeu de relançamento económico. Para estar preparada quando a crise chegar. Não há segundas oportunidades. Se cometerem os mesmos erros de 2008 podem esquecer o projeto europeu. Os fantasmas que nos atormentam há mais de uma década tomarão de vez o poder. Comecem já, antes que seja tarde.

Portugal começou, e é caso para dizer que a receita é a de sempre: reduzir obrigações fiscais das empresas, que virão depois a ser pagas pelos contribuintes em IRS, facilitar o lay-off, levando a perda de um terço do salário dos trabalhadores abrangidos e rigorosamente plano nenhum para animar a economia. Como de costume, quando o mar bate na rocha quem se lixa é o mexilhão. Talvez volte a falar desta sina.»

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1 comments:

Niet disse...

O alerta de Daniel Oliveira faz todo o sentido e revela uma oportunidade flagrante. Com base em dados adiantados por Sertini e Fiorentino, dois economistas franceses de coragem qualitativa indesmentivel, os efeitos da crise bolsista e as suas repercussöes económicas e politicas podem fazer de 2020 um ano para esquecer. Sertini,director do Instituto da Financa de Franca, diz que a economia mundial näo está Longe do Krach com as quedas bolsistaa da Itália e do Japäo de dois digitos. O que colocou as pracas financeiras todas em alerta por causa dos riscos sistémicos. A economia portuguesa pode ser fortemente penalizada pelos impactos calamitosos devido à sua estrutura frágil e enganosa ligada à montagem automóvel e ao turismo étnico, indices quase terceiro-mundistas de investimento e comercializacäo. E as grandes potências- USA, China, Russia, Japäo, Alemanha e Franca- parecem aproveitar o choque bolsista para resolverem sobretudo os diferendos politicos em que andam envolvidas...Comecando pela disputa politica emocional entre a Russia e a Arabia Saudita sobre o preco e capacidade extractiva do ouro negro, com reflexos na crise turco-siria e o despoletar de uma ofensiva " guerreira " contra os empresários yankees dos hidrocarbonetos de gaz e petroleo de xisto sem possibilidades de concorrerem com os precos
dos dois lideres da OPEP. Por outro lado, a China " congelou " a revolta de Hong-Kong, talvez definitivamente, e o confinamento imposto pelo governo de Centro-esquerda em Itália corta a capacidade de contestacäo do grupo extremista de direita Liga do Norte.Lagarde vai
mostrar as suas qualidades no Banco Central Europeu contra o liberalismo puro e duro de Merkel.Niet