«Este fim-de-semana é para esquecer. O dia importante é amanhã, segunda-feira. Porque é amanhã que volta o postigo.
O postigo é o filho pródigo da pandemia. À volta do postigo, os portugueses podem pegar num café, segurá-lo nas mãos e, enquanto beberricam, congregar.
O português é postigueiro porque o português é gregário. O postigo está-nos no sangue. Parece uma coisa boa - se não fosse boa não a tinham proibido - mas é ancestral.
Nem toda a gente tem a sorte de morar em cidades e poder patrocinar quiosques. Os quiosques são os Jerónimos dos postigos.
Aliás, os quiosques são os Jerónimos não só dos postigos como dos balcões. É verdade que há quiosques que têm umas mesitas e cadeiras mas nunca houve, que se saiba, português algum que se tenha lá sentado.
Os quiosques são para estarmos de pé, usando o balcãozito para pousar o braçolo em momentos de discussão futebolística.
Há-de reparar-se que, mesmo em restaurantes finos onde só há mesas, só os portugueses degenerados é que se sentam.
Os genuínos encostam-se ao que houver. À copa, se não houver balcão. À máquina de tabaco, se não houver copa. E, se não houver máquina de tabaco, à boa, velha parede.
O renascimento do postigo veio despertar um atavismo que julgáramos perdido. Tinha florescido com a cultura do guichet - o postigo do funcionalismo, no sentido antropológico da palavra - mas a introdução das esplanadas e de outros lamentáveis estrangeirismos veio acabar com os nossos doces hábitos congregativos.
Agora a questão é saber se o postigo poderá sobreviver à pandemia. É que o pessoal reapaixonou-se pelos postigos, pelas conversas e pelo delicioso vai-e-vem que só os postigos proporcionam.
Será difícil arrancá-los outra vez dos nossos cotovelos.»
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