23.3.22

Guerra e racismo

 

«Uma (…) consequência é a desvalorização do racismo. Em Portugal, foi noticiado o caso de Domingos Ngulonda e de Mário Biaguê, estudantes portugueses de medicina na Ucrânia, que ficaram cinco dias na fronteira com a Polónia e foram tratados, segundo os próprios, como “animais de carga” com polícias ucranianos com tacos de basebol que repetiam “africanos para o fundo da fila”, onde ouviram ordens para que os negros formassem filas próprias que eram remetidas para o fim. Não se tratou, infelizmente, de uma situação isolada. No final de fevereiro, o presidente do Senegal e o presidente da Comissão da União Africana queixaram-se dos “tratamentos inaceitáveis” e “chocantemente racistas” e o próprio Parlamento Europeu viu-se forçado, no primeiro dia de março, a condenar “o racismo experimentado pelos estudantes africanos e do Médio Oriente que foram impedidos de embarcar em autocarros e comboios na Ucrânia para chegar à fronteira ou impedidos na fronteira sem que pudessem procurar segurança”. Foram posições importantes, mas que não tiveram um eco à altura. Em Portugal, Santana Lopes vangloriava-se, nestes termos, de acolher refugiados: “A receber Dasha, lourinha, de olhos azuis. (...) Absolutamente emocionante”. No Observador, José Crespo de Carvalho, professor catedrático do ISCTE e co-fundador da We Help Ukraine, publicou um artigo repugnante, em que elogiava a “crise como oportunidade", por poderem entrar em Portugal cerca de 30 mil ucranianos que “colocarão a faca nos dentes, isto é, ninguém espere que sejam trabalhadores das nove às cinco e que venham reclamar o que por cá reclamamos”, fazendo a apologia da exploração dos refugiados - prontos para serem sugados pelo oportunismo empresarial - e da instrumentalização da sua presença para rebaixar os direitos de todos, numa corrida para o fundo dos direitos laborais.»

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