2.4.23

Gouveia e Melo: o marinheiro pode já ter perdido as graças do mar

 


«Alguém sabe onde se meteu o almirante mais mediático deste país? Eu não, mas gostava. Estará escondido no porão de algum navio à espera que a tempestade passe, confiando que em Portugal tudo se esquece? É que desde que o famoso navio Mondego foi obrigado a abortar uma missão ao largo da Madeira que não se vê sombra do almirante, até agora sempre em prontidão para comentar coisas múltiplas na comunicação social.

Depois da avaria no navio Mondego, o mesmo em que se recusaram embarcar a 11 de Março vários militares por razões de segurança, a ministra da Defesa falou, o comando da Marinha no Funchal falou, e Gouveia e Melo zero. Nada. Conhecendo a sua performance de grande comunicador da TV, só se entende este silêncio do almirante por razões políticas. Depois do estardalhaço que fez no discurso às tropas a seguir à revolta de 11 de Março, o almirante tinha a obrigação de vir agora dizer qualquer coisinha. Independentemente de a disciplina ser uma base essencial das Forças Armadas, a cadeia de comando provou que estava errada ao considerar que estava tudo em ordem no navio Mondego. E agora deve dar explicações ao país.

O almirante Gouveia e Melo afirmou, naquelas declarações ao Sol que ficaram famosas, que "o circo" à volta da rebelião das tropas que se recusaram a embarcar tinha a ver com as sondagens que o dão como favorito para as presidenciais. Ou seja, politizou o caso em todo o seu esplendor. Podemos então concluir que o episódio desta semana pode ter funcionado como um tiro no porta-aviões relativamente às suas ambições presidenciais.

É verdade que o povo esquece depressa, que a imagem do almirante é poderosa nas massas, que ainda falta muito tempo para as Presidenciais. A própria agenda política esteve ocupada com o pacote da habitação, o assassinato de duas mulheres da comunidade ismaelita, a eutanásia, as sondagens, para se lembrar de um almirante misteriosamente silencioso.

Escondido em algum porão longe dos holofotes, aparentemente Gouveia e Melo espera que os portugueses esqueçam o episódio do navio. O esquecimento, como sabemos, é um poderoso álcool-gel para carreiras políticas.

Vamos esperar pelas próximas sondagens para as presidenciais – sondagens que nem provocaram a avaria do navio e, pelos vistos, nem o "circo" que o almirante disse ter sido criado com o motim. A esta luz, o seu discurso às tropas, com direito a directos televisivos e linguagem militar hardcore parece patético. Mas a euforia do almirante com as presidenciais pode, depois deste episódio, ter ficado comprometida.»

Ana Sá Lopes 
Newsletter do Público, 31.03.2023 (Parte 1)
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1 comments:

Manuel Nunes Francisco disse...

Como os portugueses são de memória curta, ele vai aguardando e preparando umas novas papas e bolos, para enganar os tolos!!!...😂🤔🫡