«Nunca a música “Dia de S. Receber”, dos Xutos & Pontapés, foi tão atual, principalmente quando uma família tem de escolher entre comer, pagar as contas da eletricidade, do gás e da água ou o crédito à habitação. Quando isto acontece, significa que desceu um degrau na escada da exclusão social. Em 15 anos houve três crises em Portugal e em cada uma delas aumentou o número de pessoas em extrema vulnerabilidade social. Os pobres saíram da crise mais pobres do que entraram. Os últimos dados da Deco Proteste confirmam que, no ano passado, 66% das famílias vivia com dificuldades financeiras, sendo que destas, 8% viviam em situação crítica, um aumento quando comparado com 2021. Estas famílias não podem pagar as contas de serviços básicos com o rendimento que têm devido à guerra na Ucrânia e a consequente escalada da inflação, que disparou os preços dos alimentos e serviços domésticos essenciais, como eletricidade, água ou gás.
Não é por acaso que em cinco anos de barómetro da Deco Proteste, que avalia a capacidade de os agregados familiares enfrentarem as despesas de alimentação, educação, habitação, lazer, mobilidade e saúde, 2022 foi o ano em que o índice atingiu o valor mais baixo. E as perspetivas para 2023, por sua vez, não são mais animadoras. Em agosto, o Banco de Portugal e o INE vão apresentar os resultados do Inquérito à Situação Financeira das Famílias, que deverá confirmar maior pobreza dos mais pobres.
Apesar da recuperação do emprego e do facto da média dos rendimentos familiares estar a voltar aos níveis pré-pandémicos, a verdade é que a bolsa de pobreza continuou a crescer. Isso porque, embora a inflação afete a todos, seu impacto é proporcionalmente muito maior nos que têm rendimentos mais baixos. Isto significa que, nas famílias de menores rendimentos, um aumento como o que ocorreu no nas taxas de juro do crédito à habitação ou na renda da casa, obriga as famílias a privarem-se de outros bens básicos como a alimentação e as deixa sem margem de manobra para enfrentar qualquer situação inesperada.
Ainda não sabemos o impacto da ajuda decretada pelo Governo para atenuar os efeitos da inflação, como o IVA zero em alguns produtos, mas está claro que a situação exige persistência nas políticas sociais para ajudar os grupos mais vulneráveis para que, pelo menos, possam ter rendimentos suficientes e poderem pagar as contas do mês.»
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