10.2.24

Sermos felizes todos os anos

 


«Se quiséssemos ser felizes mais vezes, a melhor (única?) forma seria replicando eleições legislativas todos os anos. Podíamos não ser um país mais desenvolvido, mas o nosso ânimo seria alcandorado aos céus. Durante umas semanas, Portugal olha-se ao espelho e vai vendo coisas diferentes no reflexo que é devolvido. Algumas coisas tristes, típicas de uma nação periférica que não desarma da apatia económica, mas sobretudo coisas maravilhosas. Porque quando estamos em campanha, e esta tem sido particularmente profícua em promessas, entramos no modo leilão. Tudo, claro está, devidamente aditivado pela circunstância orçamental de termos muito, mas mesmo muito, dinheiro em caixa e, politicamente falando, de nos encontrarmos perante a mais do que certa necessidade de formar coligações que garantam a estabilidade.

Lançam-se propostas sonoras vazias de conteúdo, pouco estudadas, intenções benévolas de não deixar ninguém para trás, castigando os ricos e salvando os pobres. Há para todos os gostos: o Estado a fiar casas, os lucros excessivos da Banca a pagar o crédito à habitação, médico de família para todos, subsídios de risco extensíveis a todas as forças policiais, recuperação de tempo de serviço dos professores, baixas do IRS e do IRC, pensões de reforma equivalentes ao salário mínimo, pré-escolar gratuito nos privados. Populistas e não populistas atiram a tudo o que mexe. Os protestos grassam. Ser comedido é ser frouxo.

Os programas políticos (que ninguém lê) apenas servem para dar credibilidade institucional aos números mediáticos dos candidatos a primeiro-ministro. Não queremos ser convertidos, queremos ser convencidos. Tendemos, progressivamente, a gostar mais deste do que daquele não pela justeza e aplicabilidade das suas propostas, mas pela eficácia dos seus gestos políticos como atos de sedução das massas. Valha-nos que um povo feliz é um povo realizado.»

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