2.4.25

Le Pen: guardem os foguetes que as notícias não são boas

 


«Não conheço a legislação em causa e não me vou envolver no debate jurídico em torno da condenação de Marine Le Pen. Olhando de fora, tenho dúvidas quanto à pena de prisão num caso desta natureza, e ainda mais quanto à inelegibilidade, que deveria ser absolutamente excecional. Essas dúvidas só são agravadas pelo facto de a sua aplicação ter lugar antes de o processo transitar em julgado. Imagino que isto corresponda à lei francesa, mas recordo que François Fillon teve um caso que, sendo menor na sua dimensão, até era mais grave em profundidade: a sua mulher era dada como falsa assessora. Perdeu as eleições presidenciais por isso. Não foi impedido de concorrer.

Claro que os sistemas legais são diferentes, mas nada disto tem que ver com a situação de Donald Trump ou de Jair Bolsonaro. Sempre achei um erro afastar Trump das eleições através nos tribunais por questões que não fossem a invasão do Capitólio. O mesmo se aplica a Bolsonaro. É a tentativa de golpe de Estado que o devia impedir qualquer um de concorrer. Nestes casos, a justiça deve ser implacável. Quem recusa os resultados eleitorais e o poder democraticamente sufragado viola o fundamento das eleições e, assim sendo, não pode participar no jogo.

Seja qual for o entendimento jurídico, não vejo razão para celebrar as consequências políticas desta sentença. Tem tudo para ser trágico. E com o tempero, especialmente apetitoso para a extrema-direita francesa, de a acusação vir de Bruxelas. Não é por acaso que Jean-Luc Mélenchon, apesar de sublinhar a gravidade da condenação, veio contestar a inelegibilidade. Primeiro, porque espera conquistar-lhe alguns votos. Depois, porque sabe que esta decisão pode ser um presente envenenado para a democracia.

Jordan Bardella é considerado, por 59% dos eleitores da União Nacional, melhor líder do que Marine Le Pen, que tem a preferência de apenas 37%. Junte-se a esta preferência a vitimização face a um ataque vindo de fora, e temos o caldo perfeito.

O que me deixa triste é ver a mesma Europa que se mostra incapaz de regular as redes sociais ou afastar a Hungria da UE em permanente busca de atalhos para travar a ascensão da extrema-direita. Atalhos que a própria não deixará de aproveitar. Isto não vai correr bem. Se Le Pen não concorrer, como é quase certo que não concorra, Bardella poderá fazer uma campanha ainda mais forte. Se concorrer, Le Pen irá a votos como vítima perseguida por Bruxelas. Ache cada um o que achar desta sentença, não vejo razões para lançar foguetes.

Nisto, só tem graça uma coisa: ouvir o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, dizer que os caminhos da Europa são cada vez mais a “violação das normas democráticas”. De facto, não é tão eficaz como o encarceramento seguido de “acidente” de Alexei Navalny. Seria mais limpo atirar a senhora de uma varanda. Nisso, as democracias europeias ainda têm muito a aprender com Putin.»


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