26.9.07

Plenários na clandestinidade (2)

Vítor Dias deixou o seguinte texto na caixa de comentários ao meu post. Pela sua importância, dou-lhe «vida própria» e respondo-lhe aqui.

Aproveito para agradecer muito sinceramente ao autor: razão tinha eu para pedir ajuda no esclarecimento das razões da cisão no plenário de 73. Acho que VD resume muito bem o que era, de facto, o fundo da questão, embora as razões que eu aponto também estivessem presentes.

Duas notas para VD:
1 – Não conheço – e gostava de conhecer – o depoimento de Jorge Sampaio de que fala. Sabe onde pode ser encontrado?
3 – A referência a Pedro Coelho foi feita por João Tunes num comentário ao post e ele situa-o claramente entre os «futuros socialistas» e não no grupo que abandonou o plenário.

«Em termos muito abreviados, gostaria de dar um testemunho parcial sobre o plenário de Santa Cruz em que, por sinal, fui o último orador a falar.

E venho sobretudo discordar da visão de Joana Lopes segundo a qual o que aí se passou «girava, como sempre, à volta de questões de representatividade e de resistência ao que era interpretado como imposição de hegemonia por parte do PCP e suas franjas».
Creio que isso é ver só a superfície das coisas. É certo que na CDE de Lisboa tinha havido um aceso debate em torno de questões organizativas e funcionamento, mas o que pesou decisivamente no afastamento daquele grupo ou corrente do movimento de unidade eleitoral foi a circunstância dessa corrente ter entrado num processo de radicalização política que desvalorizava a intervenção eleitoral como forma de luta e contestava a centralidade da tónica antifascista (insistindo numa tónica de luta pelo socialismo).

Foi, em termos de orientações e ideologia, um abandono ou uma saída «pela esquerda» em relação ao PCP para já não falar que esse grupo não apreciava especialmente a participação do PS nesse esforço de 73 até porque tinha sido bastante activo na polémica com a ASP/CEUD em 69.

Bata ler um honesto depoimento que Jorge Sampaio (que também falou no plenário de Santa Cruz) fez para um jornal por volta dos 30 anos do Congresso de Aveiro de 73 (onde não foi) para se perceber que as raizes das divergências eram pelo menos muito próximas da natureza das que eu procurei descrever.

Pareceu-me que alguém deu o Pedro Coelho como sendo dos que abandonaram o plenário mas isso é completamente falso, pois honra lhe seja feita, e calcular-se-á que sei do que falo, foi ele e o Arons de Carvalho que tiveram um grande papel para que se não repetisse a divisão de 69.»

8 comments:

Anónimo disse...

Cara Joana Lopes,

1. Também retenho que as duas grandes questões em causa nesse Plenário foram a “reunificação comunista-socialista” no frentismo eleitoral antifascista (a superação da divisão CDE/CEUD de 1969), o que foi conseguido com ambas as correntes a ficarem no “plenário” até ao fim (e que formaram as listas CDE para as eleições desse ano), e a “nova cisão” provocada pela “esquerda radical”, a que abandonou o “plenário”. As questões de organização/delegados foram formalismos tácticos menores e obviamente que não eram as questões políticas fundamentais que uniam ou dividiam. Essas eram, repito, uma “reunificação” e uma nova “cisão”.
2. Não houve “um único orador”. Pedro Coelho falou, Isabel do Carmo falou. E outros, além de Jorge Sampaio (segundo este, embora não me lembre de ele ter lá estado e intervido). Embora não muitos, mas não um único, porque o abandono dos “cisionistas” e razões de segurança, levaram a que o “plenário” tivesse durado pouco tempo.
3. Como disse antes, Pedro Coelho era um dos representantes da “bancada socialista”. Falou, ajudou à unidade comunista/socialista e, obviamente, pertenceu ao número dos que estiveram até o fim do “plenário”.

João Tunes

Joana Lopes disse...

Caro João,
Duas precisões:
1 - Uma parte significativa dos que cindiram neste pelnário de 73 estiveram, em 69, na CDE com o PCP (paralelamente à CEUD), até como candidatos - para simplificar os futuros MES. E, como se recordará, em 73, as listas comuns «socialistas/comunistas» não chegaram a concorrer, desistindo dos dias antes das eleições.

2 - V. Dias não diz que foi o ÚNICO mas o ÚLTIMO orador.
Jorge Sampaio esteve em Santa Cruz e «cindiu» - sem qualquer espécir de dúvida.

Anónimo disse...

Cara Joana Lopes:

Começo por pedir desculpa ao João Tunes por lhe atribuido uma coisa que ele, de facto, não tinha dito sobre o Pedro Coelho ( que, muita gente - mesmo no PS - não sabe ou o esquece, era de certa forma o secretário geral interno do PS de Abril de 73 - fundação do PS - em diante).

Quanto ao depoimento que referi do Jorge Sampaio - e agora assalta-me a dúvida se foi no 25º ou no 30º aniversário do 3º C.O.D de Aveiro -julgo que terá sido no Público (portanto de 4 ou 5 de Abril de 2003), mas vou tentar «num certo sítio» ver se terá sido seleccionado e arquivado em termos de documentação.

Aproveito para lembrar que, na sessão do 30º aniversário, Jorge Sampaio falou como Presidente da República e que o José Manuel Tengarrinha fez uma importante comunicação sobre a evolução da oposição desde o 1º Congresso (de 1959)mas que, infelizmente, suponho não estar publicada. Se alguém dispuser de informações sobre este assunto,agradecia que as trouxesse para aqui.

Logo que seja possível darei notícia do resultado das minhas diligências.

Sem intuitos proselitistas ou manifestação de imodéstia, para quem não saiba, aproveito para informar que na página do PCP há um dossier bastante completo sobre o 3º C.O.D (em http://www.pcp.pt/index.php?option
=com_content&task=category&
sectionid=11&id=272&Itemid=116 ) que elaborei na altura do seu 25º aniversário e do qual destaco uma breve antologia (que suponho não existir em mais lado nenhum) da forma como a imprensa facista tratou essa iniciativa.

Por fim, pedindo desculpa pela extensão mas os «sexagenários» antifascistas estão cheios de recordações, aproveito para dar outra informação e fazer outro pedido.

É que o plenário de Santa Cruz foi, na semana seguinte salvo erro, noticiado em primeira página do Expresso (com identificação do local)numa notícia assinada por um pseudónimo (já não tenho a certeza se por detrás dele estava o já falecido Roby Amorim ou outro jornalista) onde, como era «moda» em certos circulos de extrema-esquerda, a CDE de Lisboa era qualificada (injustamente) de «oposição clássica».

O que é certo é que na direcção da CDE ficámos muito irritados com a notícia designadamente por razões de segurança e decidimos enviar ao «Expresso» com pedido de publicação uma carta (de grande substância política)também assinada com pseudónimo e, por acaso, redigida por mim.

O Expresso dela só publicou três linhas absolutamente anódinas mas
calculo que assim terá sido mais por efeito da censura.

Entretanto essa carta foi divulgada nos circuitos da CDE numa edição à base de stencil electrónico, em que me lembro perfeitamente que o texto estava em itálico ( já de máquina de escrever eléctrica) e, coisa pouco vulgar, o papel era amarelo.

Como nem o meu saudoso amigo e camarada Lino de Carvalho (grande guardador de papéis) a tinha, aqui deixo o apelo de que, se alguém a tiver, dê sinal disso, porque de facto é um documento que gostava de ter, não tanto por ser o autor, mas por causa do seu conteúdo e argumentação.

Sinceramente, desculpem todos tanta conversa.

Anónimo disse...

Cara Joana Lopes,

As lembranças são como as cerejas, mesmo quando estas são de estação passada (ou então são congeladas ou cristalizadas, as que perduram mais).

Ligado ao mesmo "plenário", recordo-me como fui lá ter. Activista da CDE (nos "sócios-profissionais" que reunia num andar da Almirante Reis), fui convocado para ir ao "plenário" sem saber qual o local do evento. Apresentei-me num local pré-combinado na entrada de Moscavide com "um grupo" (local que nos foi destinado como "ponto de concentração"), aí o nosso contacto coordenador foi o Gouveia (militante do PCP, dono de uma papelaria-livraria em Moscavide e que seria preso pela PIDE ainda antes do 25A), que nos deu então um "croquis" do local do "plenário" (só então soubemos onde era o local) e, como "credencial", para posterior controlo no acesso ao pinhal junto à praia de Santa Cruz, um bilhete de transportes públicos. Julgo que eram vários os "pontos de concentração" e, eventualmente, diversas as "credenciais". O certo é que, em termos conspirativos, o "plenário" fez-se, apesar do abandono dos "radicais", sem que a PIDE o impedisse ou o tivesse perturbado.

PS 1 - Com certeza, Joana, a "cisão" de 73 foi diferente da de 69. Os "radicais" estiveram com o PCP na CDE em 69, os "socialistas" estiveram com o PCP em 73. E quando se fala de "radicais" a expressão aplica-se aos que queriam ultrapassar o PCP pela esquerda (não cabendo nela os grupos maoístas que não alinhavam em "fantochadas eleitoralistas"). Mas não é completamente exacto afuninálos como "futuros MES", uma parte (expl: grupo da Isabel do Carmo) iria criar o PRP-BR.

PS 2 - Peço desculpa ao Vitor Dias por ter confundido, no seu texto, "último" com "único".

Anónimo disse...

PS 3 - Esqueci-me de assinar o último comentário.

João Tunes

Joana Lopes disse...

V. Dias: Não me lembrava da notícia do Expresso, embora trabalhasse mesmo ao lado e tivesse estreito contacto com alguns jornalistas. O anónimo tanto pode ter sido o Roby como o José Manuel Teixeira ou A.(?)Carvalho (que também já morreu e foi genro do Dias Lourenço.)

J. Tunes: Em 69, os futuros PRP de 73 ainda estavam longe de existir e, sobretudo, não alinhavam com os futuros MES. Alguns estavam ainda no PCP.

Para os leitores em geral: passem à frente! ISTO É ESCRITA CIFRADA PARA "SOISSANTE-HUITARDS"!

Anónimo disse...

Ai a memória !.

Obrigado pela ajuda. A notícia do Expresso, com pseudónimo, era do A. (Adriano) de Carvalho.

E lembro-me que era assinada com pseudónimo porque a «minha» carta terminava com qualquer coisa do género: quando o Expresso revelar quem é o ....(pseudónimo)eu também revelo qual é o meu verdadeiro nome.

Joana Lopes disse...

V. Dias: A comunicação de J.Sampaio no 25º aniversário do Congresso de 73 pode ser lida aqui:

http://jorgesampaio.arquivo.presidencia.pt/pt/noticias/noticias/discursos-426.html