5.6.10

Se não é facilitismo, é marketing


Nem entro nos detalhes da discussão sobre a possibilidade de alunos que acabaram / não acabaram, com sucesso / sem sucesso, o 8º ano poderem / não deverem fazer exames do 9º. Há tantas notícias, complementares e contraditórias, sobre o assunto, que é inútil sequer resumi-las e, ainda mais, contestá-las.

Mas ouvi ontem uma entrevista feita à ministra Isabel Alçada e retive dois aspectos que me parece importante sublinhar.

Primeiro, disse que será uma percentagem reduzidíssima de alunos, praticamente residual, que, hipoteticamente, poderá vir a tirar partido da nova medida. Estamos portanto no mundo do «mesmo que seja só um, valerá a pena»? Mas em nome de quê, e com que fim, se nem se estará a trabalhar para estatísticas? Window dressing, pura e simplesmente.

Segundo e mais importante, Isabel Alçada referiu-se várias vezes aos países em que não há «repetência», ou seja, na nossa linguagem corrente, em que não se chumba. O que não explicou é que se trata de uma cultura totalmente inexistente em Portugal e, na minha opinião, praticamente impossível de concretizar com seriedade, ou seja, com outro objectivo que não o de ficarmos melhor posicionados nos gráficos.

Concretizo com um exemplo: o meu filho fez uma parte do secundário numa escola internacional em Bruxelas, onde, segundo creio, não se praticava a tal repetência. Mas, em qualquer teste, ainda que o mesmo fosse bem classificado globalmente, até com nota elevada, uma resposta errada era «trabalhada» em conjunto pelo professor e pelo aluno. Por exemplo, se se tratasse de um problema de Matemática, não só se explicava a razão do erro, como se fornecia três ou quatro exercícios semelhantes a serem resolvidos, até se ter a certeza que a dificuldade encontrada no teste estava, de facto, ultrapassada.

É isto que se espera fazer, à pressão, nas condições existentes e com a motivação reinante no meio dos nossos professores? Acredite quem quiser.
...

5 comments:

cs disse...

acha???????????lolllllllllll

Joana Lopes disse...

Bem-vinda, cs, há muito tempo que não a «via»! :-)

Manuel Vilarinho Pires disse...

Joana,

PS (pré-scriptum): O teu sorriso saiu decapitado... já me aconteceu, consequências da forma como os processadores de texto tratam o "hífen", não como um nariz, mas como uma quebra...

Depois de ler este "post" completo repito a resposta que ontem dei, pelas 3 da manhã, acabado de chegar do Douro e lendo apenas o título, que não era hora para seguir "links"...

Isto não é facilitismo, nem marketing...
A Isaura, que é educadora de infância na rede pública, demorou um centésimo de segundo a descodificar a notícia. É o sistema a livrar-se dos repetentes sistemáticos, que não desejam lá estar e que são indesejados, e de que não tem outra forma de se livrar por haver ensino obrigatório: declara-os formados.
Não é pois facilitismo (oferecer-lhes um grau que não merecem) nem "marketing" (favorecer as estatísticas do sucesso escolar), é apenas o mais puro cinismo: eles estão a mais no sistema mas, se o Governo decretasse o fim do ensino "obrigatório", seria acusado de retrocesso civilizacional; assim, manda-os embora e liberta o espaço ocupado por eles sem ser obrigado a questionar o sentido do ensino obrigatório.
Questionemo-lo nós...

Joana Lopes disse...

Mas livram-se como, se é a ministra e muitos outros, a dizer que poucos poderão aproveitar a boleia?
Estás portanto a assmir que os exames serão «canja» para que todos passem? É bem provável, mas isso incluo no facilitismo.

Manuel Vilarinho Pires disse...

O dizer que são poucos descodifica-se assim: por favor não me batam muito, que isto não vai ter um impacte tão extenso como isso...

Por poucos que sejam, podem ser um problema para o funcionamento das aulas, porque são (nestas idades) muito mais "velhos" que os outros, e perante a impossibilidade de lhes dizer "não querem estudar, está bem, vão-se lá embora à vossa vida...", e a fatalidade de ter miúdos de 16 anos misturados com miúdos de 12, as escolas têm aqui uma oportunidade de lhes acelerar a saída pela única porta legal ou seja, conferindo-lhes o grau de "escolaridade obrigatória completa".
Isto é o equivalente a legislar a definição de escolaridade obrigatória, não através do 9º ano completo, mas da frequência da escola até aos 15 anos.
Mas como não se quer legislar para sair do mundo a fingir, finge-se que eles completam o 9º ano...

É rebaixar a "escolaridade obrigatória"? Sim!
E ainda a vão aumentar, e quem for contra é apelidado de boçal? Sim!
E a escolaridade obrigatória pode prescrever-se por via legislativa? Não! Mas a fingir, pode...