No dia 12 de Novembro de 1975, operários da construção civil iniciaram o chamado «Cerco à Constituinte», que durou até ao fim da manhã do dia 13. Um breve resumo.
«Perante a decisão governamental de encerrar as instalações do Ministério do Trabalho na Praça de Londres, os dirigentes sindicais conduziram os associados (…) num desfile que subiu do Terreiro do Paço até à Alexandre Herculano, inflectindo então para a sede do poder político, onde encheu a Praça de S. Bento e adjacentes.
Depois de um encontro, inconclusivo, com o ministro Vítor Crespo (…), os representantes dos trabalhadores foram recebidos, em audiência, pelo chefe do executivo, Pinheiro de Azevedo.
Ao fim de três horas de discussão (…), Pinheiro de Azevedo comprometeu-se a fazer sair o Contrato Colectivo de trabalho, vertical, com o sector, até ao próximo dia 27, e a abrir um inquérito ao Ministério do Trabalho [com algumas contrapartidas por parte dos sindicatos]. (…)
Terminada a reunião, o primeiro-ministro acede a falar aos manifestantes. Ao aparecer à varanda, porém, Pinheiro de Azevedo é “largamente vaiado” pelos manifestantes, que mal o deixam concluir as primeiras frases. (…)
Decididos a permanecer no local até que um acordo favorável seja alcançado, os manifestantes fecham o cerco a S. Bento, onde os deputados constituintes se vêem obrigados a permanecer durante 16 horas. (…)
A saída dos sequestrados, ao fim da manhã [do dia 13], por entre alas dos manifestantes, que apupam uns e vitoriam outros (à esquerda do PS), alguns dos quais correspondem erguendo o punho, ficará como uma das imagens mais fortes do processo revolucionário em curso.»
In: Adelino Gomes e José Pedro Castanheira, Os dias loucos do PREC.
N.B. - Até hoje, dura a polémica sobre o verdadeiro âmbito deste «cerco», nomeadamente quanto ao papel do PCP no mesmo. A ler, por exemplo:
- Vítor Dias, Nos 25 anos da Constituição da República
- Raquel Varela, O cerco da Constituinte e o PCP
1 comments:
Obrigado, Joana Lopes, pelo rigor das referências a esta muito viciada questão e pelo link para o meu artigo.
Infelizmente, seguindo o link que justificadamente faz para o texto de Raquel Varela, encontro esta historiadora a acabar por dar corda à maior falsificação quando escreve que se tratou também de «Uma demonstração de força dos trabalhadores que QUESTIONAM A PRÓPRIA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE, ao sitiar o seu local de reunião e sequestrar os deputados aí reunidos».
Ora, a respeito desta afirmação de Raquel Varela, permito-me reeditar o que em tempos escrevi na caixa de comentários do «vias de facto»:
«Sobre a utilização deliberadamente instrumental da expressão «cerco à Constituinte», os leitores interessados podem ler o meu post (de 2007) «a mentira mil vezes repetida» aqui em http://tempodascerejas.blogspot.com/2007/03/mentira-mil-vezes-repetida.html.[POST DA 1ª SERIE DO BLOGUE E PORTANTO NÃO ACESSÍVEL]
Esse texto inclui esta passagem :«Mas esse facto real não pode transformar aquela concentração de trabalhadores nem num suposto “cerco à Constituinte” nem numa acção deliberadamente dirigida contra os trabalhos a que aquela Assembleia estava vinculada por mandato popular, ou seja elaborar uma Constituição para o Portugal libertado do fascismo.
E se não é assim, então que dêem um passo em frente todos os que, com recurso à ampliação das fotografias da concentração, forem capazes de provar que no mar de cartazes e panos, em vez de reivindicações socio-laborais ou de política geral, se encontra sim um oceano de invectivas contra a Assembleia Constituinte e de gritos de ódio contra a elaboração da Constituição.
Que dêem um passo em frente todos quantos forem capazes de contar (só inventando) quais foram então as tenebrosas reivindicações políticas que os manifestantes tenham dirigido aos deputados à Constituinte ou ao seu Presidente. (...)»
E em comentário a esse post escreveu então o dr. José António Barreiros:«Na altura eu era Secretário do Conselho de Ministros, sendo primeiro-Ministro o almirante Pinheiro de Azevedo. Fiquei «cercado».É uma história longa, dará um «post» em qualquer ocasião. Assisti ao ir e vir da comissão negociadora, vi a betoneira que vedada a saída pela Rua da Imprensa, testemunhei por isso, que o alvo era o Governo não a Assembleia, a questão sindical não constitucional. Mais, quando da descida do helicóptero, devemos aos que ainda controlavam o «cerco» do lado dos manifestantes, terem conseguido suster o que poderia ter sido uma tragédia.
Tem pois razão o Vítor Dias. Esta é a verdade. »
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