Estive de passagem no Qatar, há dois anos, antes de se falar tanto desse país pelas piores razões: as condições em que vivem – e morrem – os trabalhadores estrangeiros que estão a construir infraestruturas para o Mundial de Futebol de 2020.
É um país insólito. Não é fácil imaginar a vida concreta de cerca de 500 mil pessoas que não trabalham porque tudo lhes é proporcionado gratuitamente e que ainda recebem cerca de 35.000 US$ / ano desde que nascem. Todas as tarefas são asseguradas por um milhão adicional de estrangeiros (são agora muitos mais). Constrói-se loucamente, só se vê carros topo de gama e centros comerciais luxuosos, campos de golfe que custam uma fortuna para serem mantidos verdes.
Mas num país onde se criam cavalos, para todo o tipo de competições, com um estatuto absolutamente invejável – alimentação de primeira, habitações com ar condicionado e piscinas privativas – deixam-se morrer seres humanos «porque sim».
Vale a pena dar uma vista de olhos ao dossier que o jornal The Guardian tem publicado, nos últimos dias, sobre o tema e de que o Expresso diário se faz eco hoje.
Há operários imigrados que ganham 7,5 euros por dia, que se queixam de salários em atraso há mais de um ano e de viverem em condições degradantes, em casas cheias de baratas, com colchões rudimentares ou maus beliches. The Guardian descobriu também «um grupo de 65 operários que trabalham há vários meses sem receber salário e que dormem oito em cada quarto, sem água potável nem casa de banho».
Entre 2012 e 2013, 70 trabalhadores estrangeiros morreram em acidentes de trabalho ou ataques cardíacos nas obras de construção de infraestruturas para o Mundial, 144 morreram em acidentes de trânsito e outros 56 suicidaram-se, segundo o balanço oficial do governo do Qatar.
Entretanto, os cavalos banham-se calmamente nas piscinas que partilham com um ou dois camaradas. Há várias, junto das suas casas, para que estejam à vontade e não se incomodem uns aos outros.
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