«Já me aconteceu, como a todos, ter cuidados de saúde por causa de viagens. Tomei a vacina da febre amarela julgo que para ir ao Peru. Quando ia à Índia anualmente em trabalho fazia a profilaxia da malária (tremendamente tóxica; na última destas viagens estava a tentar engravidar e já não a tomei, porque de tão benigna podia ter consequências uterinas). Tenho visto, portanto, com normalidade a discussão sobre o passaporte de vacinação da covid. É de elementar bom senso assegurarmos que os vírus e as variantes viajam pouco pelo mundo.
Porém, julgo que a conversa está só, e mal, focada nas viagens. Inicialmente os cientistas diziam-nos que a covid provavelmente iria tornar-se mais suave, correria pela população como uma normal gripe. O que se passa é o contrário. O contágio tem garantido o surgimento de variantes mais selvagens, mais contagiosas e tão ou mais mortais. Que podem, ou não (não sabemos), ser combatidas com as vacinas já existentes.
A vacinação do mundo todo levará ainda dois ou três anos, nas alternativas mais otimistas. Ora uma variante surgida numa favela do Rio de Janeiro ou de Deli, ou numa aldeia da Tanzânia, contagia com facilidade até à Europa. As vacinas poderão ou não atenuar este contágio. Mas quanto maior a proporção de população não vacinada, também maior a potencialidade de catástrofe sanitária – e económica – que vem com estas novas variantes. Por outro lado, se muita gente não se quiser vacinar, sabemos lá se não nos tornaremos também os felizes produtores de uma nova estirpe virulenta de covid.
Parece-me, então, que temos de preparar estratégias para nos proteger do perigo que a população não vacinada representa. Claro: todas as pessoas adultas têm liberdade de não se vacinarem. Pela minha parte, nem tenho vontade de debater se as vacinas são fiáveis ou não. Cada um faz com o seu corpo o que quer. Além disso, a conversa é inútil. Trata-se de pessoas para quem, primeiro, a pandemia não existia ou não era mortal. Depois os casos confirmados eram falsos positivos. As máscaras – que comprovadamente contrariam o contágio de vírus respiratórios, como se viu com a inexistência de gripe neste inverno que passou – não funcionam e são elementos de destruição populacional em massa. Os mortos numerosos deveram-se somente a problemas de falta de capacidade hospitalar. Sabe-se lá por que razão, estavam ótimos de saúde mas morreram por falta de ventiladores. Foi teimosia de levar a covid literalmente até ao fim, certamente. E agora a vacina é um perigo.
Tivemos no fim de semana passado um ajuntamento de, dizem, três mil pessoas, sem máscaras, protestando contra o mundo numa manifestação de adolescência serôdia. Os cartazes contra a vacinação destacavam-se. É fácil rirmo-nos de quem se manifesta sem levar com uma carga policial enquanto nos garante viver na mais restritiva ditadura, assim de nazi para cima. Com o ar new age de São Francisco ali à Rua da Betesga. As rezas de olhos fechados que a multidão parecia fazer nas fotografias. A satisfação de se considerarem grandes rebeldes, tão corajosos como (pelo menos) os membros da Resistência na França ocupada da Segunda Guerra Mundial.
No entanto, o ridículo não nos pode fazer esquecer o perigo. Um dos organizadores da manifestação foi diagnosticado com covid. Não sabemos quantas pessoas terá contagiado. A vacinação está atrasada na União Europeia. Há ainda muita gente com idade e problemas de saúde pré-existentes suscetíveis de desenvolver formas agudas e mortais de covid. As pessoas não vacinadas são, e vão continuar a ser (e com novas variantes pior), um perigo para todos, vacinados ou não.
Posto isto, questiono-me. Vamos aceitar alunos nas universidades que não se vacinam, colocando em risco os colegas? Vamos ter pessoas não vacinadas nas empresas com capacidade de contagiar outros trabalhadores? Teremos gente fazendo atendimento ao público sem vacina e disseminando covid pelo dito público? Empregados de mesa em restaurantes, onde os clientes não estão sequer de máscara? Profissionais como médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, cabeleireiros, massagistas e por aí em diante: não teremos o direito de saber se aquela pessoa tem uma maior vulnerabilidade à covid ou se foi vacinada?
Nada disto é risco teórico. Posso apresentar a minha experiência. Quando tive covid, não fui contagiada por ninguém num contacto de proximidade sem máscara. Foram todos testados. Terei sido contagiada por alguém numa loja, num tratamento de saúde ou restaurante.
Parece-me justo que, se toda a gente pode recusar a vacina contra a covid, também os demais têm o direito de se proteger de quem assim se constitui um risco para a saúde. Não tenho respostas definidas, sobretudo em tocando ao direito à educação e ao trabalho. Mas é uma conversa que precisamos de ter, para obter um consenso que concilie quer o direito ao trabalho, à educação e às alucinações dos anti vacinas, bem como à proteção de todos os restantes seres pensantes do país.
Sem dúvida que em certas profissões, em implicando proximidade interpessoal, os empregadores têm de poder exigir o passaporte de vacinação da covid. Não rejeito a ideia de hotéis, companhias aéreas e outras transportadoras, restaurantes, ginásios, salões de estética e por aí em diante pedirem o mesmo aos clientes antes de aceitarem prestar-lhes serviços. É de basilar sensatez alguém num guichet ou num supermercado, atendendo centenas de pessoas por dia, ter de ser vacinado – ou colocado noutra função. Uma empresa tem de poder obrigar ao teletrabalho, caso seja possível, quem com facilidade contagia colegas a cada espirro de inverno.
Cada um tem o direito de fazer escolhas para si, para o seu corpo e saúde. Mas não pode verter sobre o resto da comunidade as consequências das escolhas que livremente tomou.
Demos, portanto, lugar aos legisladores para começarem a debater como se protege a sociedade quando a crise aguda da covid passar. Concretamente, dos negacionistas das vacinas. Entretanto tratemos de proteger a comunidade já. A PSP está a elaborar um processo crime contra os organizadores da manifestação do passado fim de semana, onde todas as regras sanitárias foram quebradas. Esperemos que o Ministério Público prossiga com a intenção. Afinal os resistentes aos nazis durante a Segunda Guerra Mundial estavam dispostos a morrer pela causa. Não esperamos menor espírito de sacrifício dos gloriosos negacionistas da vacina da covid.»
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1 comments:
Considerando a substancial quantidade de afirmações perentórias que, ou não estão confirmadas ou vão mesmo contra o conhecimento cientifico em maior ou menor grau fundamentado, seria interesante que a senhora que escreveu o artigo colocasse fontes a fundamentar as afirmações. Caso contrário, só se poderá concluir ser um texto que mistura o ressabido e a falsidade com o totalitário, temperado com uma pitada de hipocondria.
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