«Podemos continuar a fingir que não se passa nada, que o tempo será o melhor remédio. Podemos defender, até, que esse tempo terá necessariamente de ser o eleitoral, que pelas urnas se nasce, pelas urnas se morre. Podemos inclusivamente esperar que o julgamento político de um grupo de deputados que insultam uma colega de profissão cega pode tardar, mas será feito. Mas aí estaremos apenas a ignorar que o momento político atual não é uma fotocópia do passado. E que os atores são outros.
Na política como na vida, os comportamentos indecentes combatem-se com menos complacência. E o Parlamento não é uma taberna, por mais que os parlamentares do Chega, tão afoitos a criticar o sistema, estejam a contribuir para enlamear a imagem desse mesmo sistema. Chamar - como foi relatado por parlamentares de diferentes partidos - “aberração” a uma deputada cega de nascença é não apenas uma demonstração de completa desadequação para o cargo, como um insulto a todos os cidadãos portadores de uma deficiência.
Legislar a quente não é o ideal, mas a sucessão de casos desrespeitosos na Assembleia da República deve levar os partidos a refletir sobre a necessidade de mexer no Código de Conduta dos deputados. Há vários exemplos internacionais: desde limitar os tempos de intervenção, passando por sanções pecuniárias.
É verdade que a educação e a decência não carecem de enquadramento legal, mas a classe política tem de dar-se ao respeito para ser respeitada. Os portugueses elegem quem querem, mas em democracia não pode valer tudo em nome de uma suposta liberdade de expressão que mais não é do que libertinagem de exceção.»
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