Quando se fala em países intervencionados pelo FMI, é inevitável que se fale do caso argentino. Recentemente, a nacionalização parcial da Repsol trouxe-o, de novo, para as primeiras páginas dos jornais. Vale a pena ler Em Le Monde Diplomatique (ed. Portuguesa) deste mês, este texto de Serge Halimi.
A nova situação
A mudança é agora… Encorajado
pela sua vitória eleitoral, o chefe do Estado impõe a sua vontade ao governador
do Banco Central, institui um controlo dos câmbios e anuncia que vai
nacionalizar um sector-chave da economia vendido ao desbarato ao sector privado
treze anos antes. Dois membros do governo, nomeados por decreto para dirigirem
a grande empresa que voltou a ser pública, expulsam de imediato os ex-patrões.
A Comissão Europeia, mas também o Wall Street Journal e o Financial
Times («um acto mesquinho de pirataria económica»), dão largas à sua
fúria. O semanário The Economist chega mesmo a recomendar que o país
«pirata» seja excluído do G20 e que os seus cidadãos (que votaram mal) deixem
de poder deslocar-se ao estrangeiro sem um visto.
O Estado em causa não se
situa no Velho Continente. É a Argentina. «Somos o único país da América
Latina, e direi mesmo do mundo, que não controla os seus recursos naturais»,
justificou-se a presidente Cristina Kirchner, a 16 de Abril passado, na altura
em que nacionalizou a maior parte dos haveres da multinacional espanhola
Repsol, até então accionista maioritária da companhia petrolífera argentina
YPF. A propriedade pública dos recursos estratégicos é menos universal do que
Cristina Kirchner sugere – a Total, a BP, a Exxon, etc. são empresas privadas
–, mas remete para outras lutas: a nacionalização da Anglo-Iranian Oil Company
por Mohammad Mossadegh no Irão em 1951, a do Canal de Suez por Gamal Abdel
Nasser no Egipto em 1956, a dos activos argelinos da Elf e da Total por Houari
Boumediene em 1971, o sequestro da empresa Iukos por Vladimir Putin na Rússia a
partir de 2003. Sem esquecer, na mesma altura, na Venezuela, o controlo da
Petróleos de Venezuela (PDVSA) por Hugo Chávez.
O governo de Buenos Aires
censura os antigos proprietários da YPF por terem distribuído aos accionistas
90% dos lucros obtidos pela empresa. Por falta de investimentos, a produção
nacional de petróleo baixou 20% desde 2004 e as importações energéticas
aumentaram vinte vezes. Situação tanto mais deplorável quanto a Argentina,
instruída por uma experiência dolorosa, já não quer depender de credores
estrangeiros (e ainda menos do Fundo Monetário Internacional) para equilibrar
as suas contas.
A audácia do governo
argentino, bem acolhida pelo seu povo, está a valer-lhe pedidos de indemnização
extravagantes, ameaças de boicote comercial e as mais sombrias profecias. Mas Buenos Aires lembra-se dos profetas de
mau agouro. Em 2001, quando a Argentina, exangue, deixou de pagar a sua dívida
e a seguir desvalorizou a sua moeda, predisseram-lhe uma crise da balança de
pagamentos e a falência económica (1). Desde então, as suas contas externas
passaram a ser excedentárias, a sua produção aumentou 90%, o desemprego e a
pobreza diminuíram (2). Em vez de se solidarizar com os accionistas da
multinacional espanhola, a Europa teria vantagem em inspirar-se no voluntarismo
político argentino. (Realce meu)
NOTAS
(1) Ler Maurice Lemoine,
«Face aos credores, atrevimento argentino e timidez grega», Le Monde
diplomatique – edição portuguesa, Abril de 2012.
(2) Ler Mark Weisbrot,
«Argentina’s Critics are Wrong Again about Renationalizing Oil», The
Guardian, Londres, 18 de Abril de 2012.
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4 comments:
Para as FAMÍLIAS não existe pior cenário do que um País que estava debaixo do seu jugo se tornar verdadeiramente Independente e Soberano... A Argentina recuperou a sua MOEDA e as SUAS POLÍTICAS MONETÁRIAS,logo, não é de admirar que ELAS estejam a fazer TUDO POR TUDO para os destruir, novamente!
Não há nada pior para o SISTEMA MONETÁRIO DAS FAMÍLIAS que a existência de um País autónomo...
(basta olhar para o Irão por exemplo!)
A Argentina, já há muito tempo maquia os próprios números de inflação abertamente. calcula-se 35% inflação anual. Não investe em energia pela mesma razão que o Brasil não investe em infraestrutura. País protecionista, da maneira mais mesquinha, agora quer ser igual a venezuela, com uma pitada de Brasil. Acabei de voltar de Tucuman. As pessoas estão preocupadas nas ruas, pois os preços das coisas não para de subir. Há desemprego em massa, e as drogas tomaram conta... e ainda querem seguir o "exemplo" brasileiro, de assistencialismo e transferência de renda. Patético.
Realmente foi em momentos raros, como este que vi artigo tão pobre e tão desavergonhadamente equivocado. Já trabalhei para empresas que atuam muito na Argentina, e tbm vou muito frequentemente para lá tanto a trabalho, quanto a turismo. A Argentina está em vias de passar fome. Inflação calculada de 34% ao ano. Salários estagnados. Eu vi e vivi a crise do início da década. Eu me aqueci em Mendoza nos tonéis de fogo que as famílias faziam para se aquecer, pois o gás e até a energia elétrica em algumas regiões tinha sido cortada. É tamanha asneira neste artigo que realmente fico frustrado ao ver que há a possibilidade de alguém apoiar o que a Argentina faz, e até o que ocorre na am. Latina..
Como se a Argentina fosse o único País na Galáxia a maquinar "os próprios números de inflação"...
Mas se assim é então até é mais honesta pois o faz abertamente, ao contrário do resto da galáxia...
E siga para bingo!
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